Programa lançado no último dia 11 destaca o Estado como indutor da retomada econômica e da transição para uma economia descarbonizada.

A sinalização política do que o ministro da Casa Civil, Rui Costa, definiu como uma virada de mesa para destravar investimentos no país foi o principal aspecto do anúncio do novo Programa de Aceleração do Crescimento feito pelo governo federal no último dia 11 de agosto. O pacote de R$ 1,7 trilhão é formado por projetos já conhecidos, por isso o recado de que o poder público estará presente para estimular e apoiar investimentos, em sua maioria privados, tornou-se necessário, na avaliação de executivos do setor elétrico.

Antes mesmo de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçar o simbolismo político da retomada do programa que se tornou uma marca de seus dois primeiros mandatos, Costa pediu ao empresários que se planejem e se organizem para apresentar sugestões ao governo, e prometeu diálogo para materializar todas as obras.

Destacou entre os pilares do programa a transversalidade e o olhar na transição ecológica e na transição energética, com foco em investimentos que tenham como objetivo a descarbonização da economia e a projeção do país no cenário internacional. O eixo que aglutina o setor energético terá R$ 540 bilhões nos próximos anos, com destaque, no setor elétrico, para fontes renováveis,
como geração eólica e solar fotovoltaica.

A prioridade será para obras capazes de destravar investimentos, disse Rui Costa. “Estamos estimando, só com linhas de transmissão, mais de R$150 bilhões de obras de parque solar, de parque eólico e de projetos do agronegócio”, deu como exemplo. Outro ponto que ele destacou é que o programa é dinâmico e poderá incluir outros empreendimentos que ficaram fora desse primeiro lançamento.

Para a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica, Élbia Gannoum, o que é importante no anúncio do programa pelo presidente da República é a sinalização que ele dá ao setor privado, ao colocar o Estado como o indutor do crescimento econômico. A executiva, que representou o setor produtivo na cerimônia de lançamento do PAC, destaca que a maioria dos investimentos previstos para os próximos anos é privado.

“O que é importante? É o efeito multiplicador que esses investimentos trazem para a economia. Então, ele vai lá, faz um pacotão e sinaliza para o mercado que o governo está muito interessado. Só de ir lá na frente e falar já traz um efeito muito grande na economia, porque o mercado trabalha com expectativas.”

Outro aceno importante, na avaliação da presidente da Abeeólica, foi feito ao Congresso Nacional, mostrando que o governo está conversando com todo mundo. Élbia Gannoum considera ainda que o governo assumiu um posicionamento do país em relação à transição energética que era necessário.

O presidente executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica, Rodrigo Sauaia, também vê no PAC uma sinalização politica importante, porque ajuda a catalisar ações, políticas e incentivos, tanto no âmbito federal, quanto nos estados e municípios.

Há, ainda, um sinal econômico no gesto do governo, interpreta Sauaia. O dirigente da Absolar afirma que quando se mobilizam recursos e novas tecnologias, há uma movimentação do setor privado, mas também de financiadores públicos e privados e de investidores internacionais que busquem no Brasil oportunidades de crescimento e de investimentos.

Sauaia destaca que na parte de geração de energia a geração fotovoltaica representa 54,8% dos R$ 75,7 bilhões em investimentos previstos até 2026. São 196 empreendimentos de geração centralizada que somam 8.569 MW, no Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. A maioria deles com recursos privados.

“Esses investimentos são certeza e garantia absoluta? Mais ou menos. Porque uma parte deles está em fase construção e outros em fase de licenciamento ambiental, mas tem uns que não foram iniciados.” Isso significa que o segmento terá um conjunto de desafios, que passam por questões de financiamento, de licenciamento, entre outras.

Para o executivo, ficaram lacunas a serem preenchidas no programa. Uma delas é a questão da inclusão da energia solar nos programas habitacionais, em especial no Minha Casa Minha Vida. Não há clareza em relação aos investimentos nesses programas.
Para o MCMV, estão previstos R$ 345 bilhões, dos quais R$ 316,7 bilhões vão ser investidos até 2026 na construção de quase 2,2 milhões de unidades habitacionais com recursos públicos e privados. A Absolar defende que o governo inclua a instalação de sistemas de geração fotovoltaica nesses empreendimentos.

Segundo Sauaia, isso exigiria aproximadamente R$ 10,9 bilhões em investimentos em energia limpa e renovável, com a instalação de 2,1 GW a 2,2 GW de potência adicionada. Para o executivo, essa é uma lacuna que existe não apenas nao apenas na habitação de interesse social. A distribuída em si não está incluída no PAC, mas o governo poderia lançar uma ou várias Parcerias
Público Privadas para suprir sua demanda por energia elétrica, instalando sistemas em escolas, hospitais e prédios públicos.

Outro ponto que não foi tratado no programa é o hidrogênio renovável. Ficou fora também o armazenamento de energia elétrica.
Energia nuclear Mesmo com a movimentação do setor nuclear às vésperas do lançamento do novo PAC, a não inclusão de Angra 3 no programa de investimentos acabou se confirmando. O governo determinou a realização de novos estudos para definir com fica a questão da conclusão da usina, e incluiu R$ 1,89 bilhão para a modernização de Angra 1.

O que isso significa para o empreendimento? “Boa pergunta. Não tenho resposta. O que posso dizer é que a modelagem feita pelo BNDES para o Eletronuclear previa uma forma de financiamento sem recursos do Tesouro. Ela não precisaria estar no PAC,” afirma o presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear, John Forman. A ideia de estar no programa era para estabelecer que a central nuclear teria prioridade.

Segundo Forman, a grande questão agora é se a Eletronuclear vai continuar o processo de retomada, ou se vai esperar o novo estudo do governo. Para o executivo, o estudo será mais uma das muitas análises de viabilidade do empreendimentos, que deve chegar à mesma conclusão de que é mais recomendável concluir Angra 3 que desmobilizar a obra, para evitar perdas maiores

Já o presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Energia Nuclear, Celso Cunha, vê um fundo de verdade no argumento do governo de que precisa complementar os estudos para que a usina entre no PAC. “Se nos olharmos o pacote do BNDES que monta a segunda etapa do financiamento da obra, ele não está concluso. Se não está concluso, não está aprovado pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e não está aprovado pelo CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) o modelo final, então, efetivamente, existem indefinições”, pondera o executivo.

Cunha lembra que há questionamentos sobre o valor da tarifa de energia da usina, mas isso pode ser contornado com medidas como o alongamento do prazo de financiamento e a redução dos custos passados, resultantes das paralisações do empreendimento.

O presidente da Abdan diz que o próprio ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ligado à Presidência da República, já declarou que várias obras, inclusive Angra 3, ainda poderão ser incluídas no PAC.

Pequenas hidrelétricas
Mesmo reconhecendo a importância de terem sido contemplados no PAC, os empreendedores em pequenas centrais hidrelétricas dizem que poderiam oferecer muito mais de uma fonte de energia limpa, pulverizada em todo o território brasileiro e com uma cadeia produtiva 100% nacional.

“Minha primeira leitura é de que foi um pontapé inicial positivo. Pelo menos incluíram as PCHs no programa. Mas o número de empreendimentos que foi colocado está muito aquém do que a fonte pode entregar”, afirma a presidente da Associação Brasileira das Pequenas Centrais Hidrelétricas e das Centrais Geradoras Hidrelétricas, Alessandra Torres. Ela afirma que os 256 MW dos 20 projetos listados não chegam perto dos projetos inventariados na Agência Nacional de Energia Elétrica.

Na opinião de Alessandra, as PCHs deveriam ser inseridas no sistema de forma proporcional à entrada de novas usinas eólicas e solares, justamente para ter a complementariedade que o sistema precisa. A Abrapch sugeriu ao governo um plano de reinserção dessas usinas no planejamento. “Acho que aquilo que foi contemplado no PAC é importante, mas são projetos que já estão em construção”, reforça o presidente executivo da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa, Charles Lenzi. Ele também avalia que as PCHs poderiam contribuir muito mais para o programa, e não somente pelo impacto econômico de gerar desenvolvimento e movimentar a indústria, mas pela pulverização dos empreendimentos e pelos atributos positivos da fonte
hídrica em termos de tarifa e como uma fonte firme e renovável.

A busca de sinergia entre os projetos é apontada como uma vantagem do novo Programa de Aceleração do Crescimento pelo presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica, Mário Miranda. “Isso é interessante, porque é função do governo fazer um plano aglutinador”, explica o executivo.

Miranda vê como o desafio atual da transmissão atender todo o potencial eólico e solar que o Brasil tem. Um desafio que, em sua avaliação, é também da indústria, diante do aumento da demanda por equipamentos para as novas instalações que já foram ou serão leiloadas nos próximos anos.

A inclusão dos combustíveis de baixo carbono é uma medida que conta a favor do PAC, do ponto de vista da Associação Brasileira do Biogás. AAbiogás recebeu o anúncio como uma decisão positiva, e a presidente executiva da entidade, Renata Isfer, acredita que tendo os incentivos necessários, principalmente na parte de infraestrutura, o biometano e o biogás poderão ser protagonistas na transição energética, por todo o potencial do segmento. “Acredito que isso vai fazer toda a diferença quando você vir esses investimentos em infraestrutura no setor de biogás”, disse a executiva.

O pacote de obras chama a atenção também do setor de seguros, que vê no incentivo à retomada uma oportunidade de novos negócios. O CEO da corretora de seguros e gestora de riscos Gualcor, Vinícius Fontão, observa que o setor de petróleo e gás é um mercado que estava meio descrente no últimos tempos, em razão de decisões de governo, mas agora, com o renascimento do PAC, a euforia voltou ao mundo das seguradoras.

“A gente tem a retomada de negócios que vinham há cinco ou seis anos bem tímidos”, avalia o executivo. Ele conta que as empresas estão bem posicionadas para atender os novos projetos na área de energia.

Por Canal Energia.
https://www.canalenergia.com.br/especiais/53256304/a-sinalizacao-politica-do-novo-pac

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