MME pode abandonar PL do novo marco legal do setor elétrico


Ministro de Minas e Energia sugere criar “conselho informal” de energia para debater os problemas do setor, em um passo para rever o marco regulatório do setor elétrico.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, reuniu-se com especialistas do segmento em Brasília na quarta-feira (26) para discutir soluções do que a pasta classifica como “assimetrias históricas”.

A reunião resultou na criação de um “conselho informal” de energia, para debater os problemas do setor. Pode ser um passo para que o governo reveja o marco regulatório do setor elétrico. Em São Paulo, Silveira anunciou que pretende fechar uma proposta de reforma regulatória do setor elétrico em 90 dias.

O encontro reuniu nomes que atuaram em autoridades energéticas, como a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). O ministro e toda a equipe estiveram presentes durante toda a reunião, que foi classificada como produtiva. Cada especialista teve tempo entre dez e 15 minutos para apresentar as respectivas visões sobre o estado atual do setor elétrico.

Um dos temas abordados foi o projeto de lei 414, que atualiza o marco regulatório do setor elétrico, em tramitação na Câmara dos Deputados depois de ter sido aprovado, no ano passado, pelo Senado Federal. Oficialmente, o PL 414 é visto como um projeto fruto de consenso do setor, mas nos bastidores diversos agentes criticam o projeto.

Para Edvaldo Santana, ex-diretor da Aneel, a reunião foi positiva e organizada para debater temas importantes do setor elétrico, com o objetivo, em busca de soluções. Jerson Kelman, ex-diretor-geral da Aneel, disse ter se surpreendido positivamente com a reunião, na qual as
ponderações colocadas reforçaram a percepção de que o modelo atual, estabelecido entre 2003 e 2004, já se esgotou, diante do avanço do mercado livre e da geração distribuída.

Além de Kelman e Santana, participaram do encontro os ex-diretores-gerais do ONS Mario Santos, Hermes Chipp e Luiz Eduardo Barata, e os ex-diretores-gerais da Aneel Nelson Hubner e José Mário Abdo.

A proposta de realização de novas reuniões, com calendário de encontros futuros, de uma vez por mês, partiu do próprio Silveira naquele momento, empolgado com o ritmo das conversas, indicando aos presentes a impressão de que essa proposta não estava na pauta até então. Outros especialistas do setor podem ser convidados a serem ouvidos pelo MME.

O Valor apurou que Silveira perguntou aos especialistas se o projeto de lei resolveria os problemas do mercado de eletricidade. Ouviu um ‘não’ como resposta. Segundo Jerson Kelman, um dos problemas no setor é a atuação de forças políticas e lobbies no Congresso Nacional em busca de soluções para temas específicos, fazendo com que os parlamentares deixem de se dedicar a políticas públicas para tratar de aspectos técnicos, cuja solução se dá nas autarquias responsáveis.

Diante da constatação de que o PL 414 não deve ser a saída ideal, Silveira sinalizou que um novo projeto de marco legal deve ser colocado na mesa. Durante evento em São Paulo com empresários, analistas de mercado e representantes dos setores elétrico, o ministro disse que em até 90 dias deve ser fechada uma proposta de reformulação regulatória do setor elétrico do Brasil, que deve “proteger” e reduzir o ônus ao consumidor de energia do mercado regulado, aquele atendido pelas distribuidoras.

Falando a jornalistas, Silveira reforçou que é preciso repensar o setor, já que as oportunidades para os investidores não podem ocorrer às custas de aumentar a energia do consumidor pobre. Segundo ele, o governo vê necessidade de se repensar e renovar o equilíbrio do setor elétrico, eliminando distorções que encarem a conta de luz.

“Se o 414 for o caminho mais rápido e estiver adequado ao que está sendo formulado pelo ministério, ele é uma possibilidade. Há também possibilidade de envio de um novo projeto que contemple o conjunto desses problemas que foram diagnosticados (…). Nos próximos 90 dias queremos entregar uma proposta concluída da reformulação. O 414 resolve parte deste problema, mas não resolve o problema contextual”, disse.

O segmento vive problemas considerados de difícil solução, como a sobreoferta de contratos de energia, mediante um cenário de preços baixos e consumo estável, subsídios crescentes a nichos de mercado, como a geração distribuída (GD), a renovação das concessões de distribuição e a alta carga tributária sobre o segmento. Além disso, as demandas da transição energética aumentam os itens da pauta do ministério de um governo que tem sinalizado priorizar novas tecnologias, verdes, como o hidrogênio verde – algo visto como algo promissor, mas ainda distante de se concretizar, segundo especialistas.

O ministro tem sido alvo de críticas por executivos do setor há meses. Em recente evento do setor de energia, no Rio de Janeiro, a reportagem do Valor voltou a ouvir críticas de várias pessoas sobre a atuação de Silveira, que tem centrado esforços para promover maior oferta de gás natural ao mercado, por meio de uma redução de reinjeção, pela Petrobras, de difícil execução num curto prazo, entre outros pontos.

O encontro do ministro com os especialistas ocorreu também num cenário político conturbado. O presidente Lula vem tentando encontrar espaço para acomodar partidos do Centrão no governo, especialmente o PP e o Republicanos, dois partidos que apoiaram o governo de Jair Bolsonaro, mas que buscam espaço na atual gestão. Nesta semana, Lula afirmou que o Centrão é uma entidade que “não existe”.

Ainda não está claro no cenário político se o MME entraria nessa seara. Silveira é do PSD, presidido por Gilberto Kassab, que está no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), um dos expoentes do bolsonarismo. O ministro apoiou e fez campanha para Lula no ano passado, quando era senador. Sem mandato, Silveira foi indicado para o MME. Procurado, o ministério não respondeu até o fechamento desta reportagem.

Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/07/30/mme-pode-abandonar-pl-do-novo-marco-legal-do-setor-eletrico.ghtml

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