Segundo informações da Agência Nacional de Energia Elétrica, há 139 GW previstos de novas ofertas até 2029, equivalente a 70% da atual capacidade de geração.
O forte crescimento da capacidade de geração de energia que vem acontecendo no Brasil nos últimos anos é muito superior que o aumento da demanda. Um dos fatores é o baixo crescimento da economia do país no período. Isso criou um cenário de sobreoferta de eletricidade que já está preocupa investidores e agentes do setor.
O país tem hoje 193 gigawatts (GW) de capacidade instalada. Além disso, há mais de 139 GW previstos em projetos até 2029, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Com tanta energia disponível, os preços no mercado de curto prazo caíram a ponto de inviabilizar o custo marginal de expansão e algumas empresas já estão revendo seus planos de negócio.
Em evento do setor no começo do mês, o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Sandoval Feitosa, chegou a propor uma pausa no crescimento da oferta. Se por um lado, o excesso de energia trouxe para grandes consumidores industriais o tão esperado “choque de energia barata”; por outro, está deixando a conta de luz do consumidor atendido pelas distribuidoras cada vez mais alta.
O paradoxo se explica por conta dos subsídios dados a determinados setores, que tem feito com que os consumidores migrem do mercado regulado (aquele atendido pelas distribuidoras) para o mercado livre (onde é possível pode escolher de quem comprar) deixando os custos de segurança e expansão do sistema aos clientes comuns.
Segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), as empresas concessionárias estão com sobra de energia contratada até 2025 em razão da perda de clientes. Soma-se a isso outro fator: a expansão da geração distribuída – principalmente a partir de pequenos sistemas fotovoltaicos de geração própria em telhados, fachadas e pequenos terrenos – tem corroído o mercado das distribuidoras.
Em alguns casos, essa energia nova se tornou mais barata que a existente, deslocando-a comercialmente e contribuindo para o aumento da oferta total. É um problema decorrente do excesso de entrada de renováveis intermitentes, que têm preferência no despacho porque não tem como ser armazenada. O CEO da Engie, Eduardo Sattamini, reclama deste brutal excesso de oferta e faz um alerta.
“O excesso de oferta é danoso ao ambiente de investimentos do setor elétrico brasileiro. Nos próximos meses, muitos dos projetos que estavam sendo desenvolvidos e alguns até com início de construção programado e com o contrato de transmissão do sistema feito serão cancelados”, prevê o executivo.
O ex-diretor da Aneel, Edvaldo Santana, diz que a oferta de hoje é para um consumo que só acontecerá em 2031. Nas palavras dele, isso provoca uma um tipo de “canibalismo” no setor de oferta maior do que a demanda, custo de geração caindo e tarifa aumentando.
“A grande indústria que tiver a chance de comprar energia está ganhando. Nunca o segmento do mercado livre pagou tão pouco por um contrato de energia como agora (…). Por outro lado, o excesso de subsídios está levando a uma sobreoferta, que vai significar uma queda de preços no mercado livre e a frustração de investimentos”, resume Santana.
A agência do setor está propondo em consulta pública o chamado “dia do perdão” para geradores de energia renovável. A corrida ao ouro para obtenção de outorgas por causa do fim de descontos nas tarifas levou ao acúmulo de contratos de transmissão, porém a forte queda nos preços de energia diminuiu a viabilidade econômica de alguns projetos. A ideia seria evitar judicialização e liberar margem de escoamento de energia no sistema de transmissão.
Por parte das fabricantes, o diretor-presidente da Nordex, Felipe Ramalho, acredita que o que está criando sobreoferta de energia são os reservatórios das hidrelétricas que estão com os maiores volumes da última década. Ele espera que 2023 apresente contratações pontuais de turbinas eólicas, por clientes que tenham projetos com alto nível de maturidade, com licenças já obtidas e conexão garantida.
“Por conta disso e dos juros nas alturas, pode haver uma desaceleração na venda de turbinas eólicas no curto prazo, pois os fabricantes de turbinas eólicas dependem de clientes que vendem energia ao mercado, e se o preço da energia está muito baixo e os juros altos, as taxas de retorno dos nossos clientes ficam menos atrativas no curto prazo e os investidores postergam a decisão de investir.”
O presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, faz uma reflexão preocupante de que futuramente pode entrar nova oferta de energia de forma compulsória, como os 8 GW de térmicas a gás previstas na privatização da Eletrobras, e a usina nuclear de Angra 3, o que pode tornar este momento ainda mais severo.
“Uma alternativa para atenuar o cenário de sobreoferta, pelo lado da oferta, seria a redução imediata dos subsídios e de qualquer obrigação de compra compulsória de energia sem necessidade de demanda. Pelo lado da demanda, a opção de curto prazo seria aumentar a exportação de energia a países vizinhos e buscar aumento de consumo local em segmentos que se beneficiem imediatamente de energia barata, como os setores alimentício e comercial”, diz.
Pensando no médio e longo prazos, Barroso sugere um processo de reindustrialização do Brasil para aumentar a base de consumo, com o crescimento da eletrificação da economia, incluindo transporte e novos produtos energéticos – que são eletrointensivos – como a produção de hidrogênio, em especial o verde, a partir da eletrólise.
Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/06/12/sobreoferta-de-energia-derruba-precos-e-pode-inviabilizar-projetos.ghtml
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