Entidade vê mais pobres ganharem com renovação de concessões de distribuidoras e abertura de mercado para todos.
O consumidor médio de energia pode ter uma perspectiva real de economia nas contas de luz e o governo pode promover a justiça social desejada, caso realize a renovação das concessões de forma combinada com a abertura do mercado de energia para todos. A conclusão é de estudo realizado pela Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel). A entidade avalia que há uma oportunidade única de promover ganhos aos consumidores e redesenhar o segmento de energia elétrica com a abertura total do mercado em paralelo à renovação dos contratos das distribuidoras. Há uma relação direta entre os temas, avalia a entidade.
Para a Abraceel, a regulação sempre privilegiou diversos segmentos da cadeia de produção do setor elétrico e o momento em que o setor discute as condições para renovar as concessões é ideal para inverter essa lógica.
Atualmente, apenas as grandes empresas consumidoras podem migrar para o mercado livre para se beneficiar da economia de energia, enquanto consumidores residenciais de maior poder aquisitivo têm liberdade para gerar sua própria energia, com aquisição de centrais de micro e minigeração.
“Não podemos pensar que, no Brasil, o mais pobre é apenas o cidadão atendido pela tarifa social. Hoje, nós temos um Brasil esquecido gigante, com quase 73 milhões de consumidores, sendo pelo menos metade disso das classes C e D”, afirmou o presidente-executivo da Abraceel, Rodrigo Ferreira. Segundo ele, a inversão da lógica de beneficiar o setor produtivo faz sentido quando o governo federal, nos primeiros 120 dias de governo, tem apontado diretrizes para atender os mais pobres com as diversas políticas públicas que estão sendo trabalhadas.
Uma nova onda de renovação de concessões está em curso, afetando 20 distribuidoras que foram privatizadas em meados da década de 1990. As diretrizes para a renovação das concessões deveriam ter sido divulgadas pelo Ministério de Minas e Energia (MME) em julho do ano passado, mas elas ainda não foram estabelecidas. “É fundamental agora deixar claro nos novos contratos que haverá a quebra do monopólio privado na venda de energia para o consumidor final de baixa tensão”, disse Ferreira.
A liberalização do mercado de energia veio ocorrendo paulatinamente desde 2018, com a redução progressiva dos limites para a migração para o ambiente livre – em que o consumidor pode escolher o fornecedor da energia. Neste ano, o piso para migração é de 0,5 megawatt (MW), para clientes conectados em alta tensão. A partir do ano que vem, qualquer cliente em alta tensão abaixo de 0,5 MW pode aderir ao mercado livre. Para a baixa tensão, a expectativa do mercado é que a liberalização seja concretizada a partir de 2026.
Para a Abraceel, as contrapartidas sociais que foram colocadas recentemente na mesa pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, podem envolver a fixação, pelo MME, da data prevista para a abertura do mercado para a baixa tensão e a definição de metas de modernização do parque de medidores de energia, sem ônus para os consumidores. “Não concluiremos a transição energética com medidores do século passado”, disse Ferreira.
Também envolvem a criação do que é chamado “open energy”, que é o compartilhamento dos dados dos consumidores de energia que hoje estão disponíveis com as distribuidoras de energia. Ferreira ressalta que é necessário, durante o processo, dar um tratamento mais adequado aos dados do consumo de energia, que pertencem ao consumidor. É um conceito semelhante ao chamado “open finance”, que permite compartilhamento de dados de clientes entre as instituições financeiras.
“Dados são a riqueza desse século, são estratégicos em mercados competitivos”, disse Ferreira. Outro estudo foi divulgado pela Abraceel, na semana passada, em Brasília, denominado “Portabilidade da conta de luz: impacto social e papel na transição energética justa”. O trabalho analisou os impactos sociais da portabilidade da conta de luz e concluiu que a abertura do mercado de energia elétrica pode beneficiar os mais de 89 milhões de consumidores de baixa tensão com economia anual de R$ 35,8 bilhões.
Esse benefício seria democratizado entre todas as classes sociais alcançando inclusive parte dos consumidores de baixa renda com acesso à tarifa social e as famílias de classe média que não têm o acesso à micro e minigeração distribuída, caracterizada pela instalação de painéis solares.
Os R$ 35,8 bilhões corresponderiam a uma economia média de 19% na conta de luz, a preços de 2022, de acordo com o estudo da Abraceel. Caso fossem considerados os preços praticados no mercado livre em 2023, mais baixos do que no ano passado, a redução média nas contas de luz seria de 23%. Entre os consumidores de baixa renda, a portabilidade da conta de luz poderia resultar numa economia adicional entre 7,5% e 10% para essa classe de consumidores, hoje atendidos pela tarifa social. “Já quase que universalizamos o acesso a energia elétrica no Brasil, precisamos agora permitir que o cidadão use essa energia a preços menores e decrescentes”, disse.
Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2023/05/22/governo-tem-chance-de-redesenhar-setor-eletrico-diz-abraceel.ghtml
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