ABRAPCH VIVE EXPECTATIVA DE CONTRATAÇÃO DE PEQUENAS HIDRELÉTRICAS E APRESENTA DEMANDAS PARA DESTRAVAR NOVAS USINAS
Por Davi de Souza (davi@petronoticias.com.br)
Um longo e tenebroso inverno para o setor de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) está um pouco mais perto do fim. O segmento vive a expectativa da contratação de 2 GW de novos projetos hídricos pelo governo, conforme determinado na Lei de Desestatização da Eletrobrás. Segundo a Associação Brasileira de PCHs e CGHs (Abrapch), o potencial de crescimento da fonte, a partir do que foi determinado na lei, é de 30%. Contudo, somente essa sinalização positiva ainda não é o bastante para o setor, que tem muitas queixas sobre como a fonte hídrica tem sido tratada nos últimos anos. Para conversar mais sobre o tema, o nosso entrevistado de hoje (16) é o presidente da Abrapch, Paulo Arbex. O dirigente da associação fez críticas aos volumes de expansão de PCHs apresentados pelo Plano Decenal de Energia (PDE 2031), que apontou para 635 MW contratados e mais 2.700 MW indicativos. “Se esse PDE for implementado assim, viveremos um retrocesso e a repetição dos erros do passado”, alertou. Além disso, Arbex conta também que a realização de leilões recentes para a contratação de termelétricas no Brasil trarão um custo alto para o consumidor e podem afetar a demanda por outras fontes em certames futuros. “O Brasil contratou 1.700 MW de térmicas emergenciais em setembro. Em dezembro, o país contratou mais 5.200 MW de reserva de capacidade. Por mais que haja o compromisso de contratar 50% da demanda de PCHs, o temor é que essa demanda seja pequena”, disse. Arbex falou ainda que a Abrapch tem trabalhado junto ao governo para desfazer alguns nós que travam o desenvolvimento de novas PCHs no Brasil, envolvendo as questões do licenciamento ambiental e carga tributária.
Qual sua avaliação sobre o PDE recentemente colocado em consulta pública pelo governo?
Achamos péssimo. O volume de contratação de PCHs e hidrelétricas, em geral, foi pífio. Assim, se esse PDE for implementado assim, viveremos um retrocesso e a repetição dos erros do passado. O Brasil está sofrendo demais por conta da redução da participação das hidrelétricas na matriz. Ao mesmo tempo, esse leilão de reserva de capacidade, realizado no final do ano passado, não vai resolver nada durante os próximos anos. Isso porque as térmicas contratadas nesse certame vão entrar em operação somente em 2026.
Então, neste momento, o que está resolvendo o problema da seca no Brasil é a volta das chuvas. Esse foi o item mais importante. O segundo ponto foi a decisão acertada do ministro [Bento Albuquerque] de acionar muitas usinas para poupar um pouco de água nos reservatórios e ajudar a resolver a crise.
O impacto gerado pelo leilão de reserva da capacidade será negativo para o país?
A verdade é que as termelétricas fósseis estão quebrando o país, o setor elétrico e a economia brasileira. O Brasil contratou 5.125 MW de energia térmica nesse leilão de reserva de capacidade. Como essas térmicas só entrarão em operação em julho de 2026, a contribuição dessa reserva de capacidade para o abastecimento será zero até aquele ano. Essas térmicas foram contratadas por preços de até R$ 2.200.
Há mais de 20 anos, infelizmente, vemos o seguinte cenário repetindo-se: as hidrelétricas não são contratadas debaixo da alegação de que a oferta foi pequena. Ao mesmo tempo, existe o argumento que só é possível contratar de 30% a 40% do volume ofertado pelas hidrelétricas, porque do contrário o consumidor será onerado. Assim, o Brasil não contrata 1.000 MW de hidrelétricas a R$ 350, mas contrata 5.100 MW de térmicas a R$ 2.200.
As térmicas contratadas nesse leilão de capacidade receberão, por cada MW instalado, como valor fixo, R$ 824 mil reais na média. Mesmo que não gerando um MW sequer. Essas térmicas emergenciais paradas custam, por ano, R$ 4,2 bilhões para o consumidor. Levando em conta a duração de 15 anos do contrato, essas usinas vão receber R$ 63,4 bilhões, mesmo sem produzir energia. No caso de serem acionadas, elas receberão um adicional, o CVU (custo variável unitário). O CVU variável para essas plantas varia entre R$ 490 e R$ 2.050,45.
É possível mensurar qual seria a economia para o consumidor no caso de contratação de mais hidrelétricas no lugar de termelétricas?
Vamos ter um realinhamento de preços. O valor da energia vai subir porque insumos, como o aço, ficaram mais caros. Ainda não temos esses números fechados porque não foi realizado nenhum leilão depois da explosão dos preços do aço. O custo de uma usina depende muito da topografia, do tipo de solo… então, o preço varia muito. Mas eu diria que uma hidrelétrica de características de topografia excepcionais, com custos baixos, pode ser contratada por R$ 250 por MW/h. Já as hidrelétricas com um custo civil mais alto podem negociar energia por R$ 350 por MW/h. Então, entre R$ 250 e R$ 350 por MW/h você consegue viabilizar todas as hidrelétricas que estão aprovadas na Aneel.
O Brasil está repetindo o mesmo erro o tempo todo. Nosso país não constrói hidrelétricas e paga por termelétricas com o preço dez vezes maior. O país está importando gás natural, jogando dinheiro no lixo, criando empregos no exterior, subsidiando indústria fóssil estrangeira e penalizando a indústria nacional e limpa.
A Lei da Desestatização da Eletrobrás inclui uma determinação de contratação de 2 GW de PCHs. Como tem sido a expectativa do setor com essa nova porta que se abriu?
Nós temos feito um trabalho muito grande junto ao Congresso para mostrar o mal que a redução da participação das hidrelétricas está causando na geração de empregos, na renda, no PIB e no preço da energia. Fora isso tudo, existe ainda a questão climática. A ONU aponta que estamos vivendo uma mudança climática porque em 200 anos a concentração de carbono aumentou em 40%.
Diante do movimento em prol das hidrelétricas, o Congresso se sensibilizou e aprovou na lei de privatização da Eletrobrás uma emenda que determina a contratação de 2 GW de pequenas centrais hidrelétricas. O ministério disse que vai cumprir essa determinação e vai contratar 50% da demanda. Só que estamos correndo um risco enorme disso virar uma vitória de Pirro.
Por quê?
O Brasil contratou 1.700 MW de térmicas emergenciais em setembro. Em dezembro, como comentei anteriormente, o país contratou mais 5.200 MW de reserva de capacidade. Assim, 7.000 MW foram retirados da demanda. Por mais que haja o compromisso de contratar 50% da demanda de PCHs, o temor é que essa demanda seja pequena, justamente por conta da contratação recente desses 7.000 MW de térmicas.
Apesar desse cenário, qual expectativa de crescimento de PCHs no Brasil?
Se o espírito da lei da privatização for cumprido, com a contratação dos 2.000 MW ao longo de três anos, estamos falando de cerca de 750 MW por ano. Isso representaria um aumento de 30%. Então, desde que o governo cumpra o espírito da lei, que é contratar 2.000 MW de PCHs e CGHs nos próximos anos, o setor deve crescer mais de 30%.
Existem 15.000 MW de PCHs aprovadas na Aneel esperando licenciamento e contratação a preços viáveis para serem construídas.
Quais serão os próximos passos da Abrapch para ajudar a destravar novos projetos de pequenas hidrelétricas no Brasil?
Estamos trabalhando em algumas frentes. Uma delas é a racionalização do processo de licenciamento ambiental. Não vamos mais aceitar que os ambientalistas fechem os olhos para o impacto de outras fontes e fique procurando “pelo em ovo” nas hidrelétricas. Na parte fiscal, existe um estudo do Inesc que aponta que, em 2019, o total das isenções e renúncias fiscais para os combustíveis fósseis foi de R$ 98 bilhões. Em 2020, esse valor aumentou para R$ 124 bilhões. As empresas ligadas ao setor de renováveis também desfrutam de diversas isenções. Enquanto isso, a indústria hidrelétrica, que é 100% nacional, está sendo taxada. Vamos entrar com um ofício no Ministério da Economia, escancarando essa questão. Se for preciso, vamos mandar também para o presidente Jair Bolsonaro, que sempre se posicionou a favor [das hidrelétricas].
Fonte: Petronotícias
Imagem: Petronotícias
16.02.2022
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