A meta, até 2030, foi uma das promessas do País durante a Cúpula do Clima, mas é vista com bastante desconfiança.
Uma gota de otimismo em um oceano de ceticismo. Essa é a sensação de muitos especialistas diante das metas relacionadas à emissão de gases divulgadas pelo Brasil na COP-26. O País informou a intenção de reduzir pela metade a emissão de gases do efeito estufa até 2030 e zerar a emissão de carbono na atmosfera em 2050.
“Uma coisa é você falar; outra, agir. O que está acontecendo é uma certa desconfiança de todos nós que temos acompanhado tudo o que vem acontecendo em termos de meio ambiente no País”, afirmou Tercio Ambrizzi, que é professor titular do Departamento de Ciências Atmosféricas da USP, durante evento promovido pelo Estadão.
Na COP de 2019, em Madri, as ações do País foram apontadas como o principal obstáculo para a regulamentação do artigo 6 do Acordo de Paris, que trata da criação de um mercado internacional de carbono. O objetivo é promover um balanço na emissão de gases, no qual países poderiam ter licença para suas emissões comprando créditos de nações que comprovadamente estão tirando carbono da atmosfera.
Na ocasião, o Brasil defendeu que os créditos vendidos não precisassem ser descontados da prestação de contas sobre o cumprimento das metas climáticas do País. Dessa forma, ocorreria uma “contabilidade dupla”. A proposta foi rechaçada por muitos países, impediu a regulamentação do artigo 6 e fez o Brasil ser considerado um dos vilões da conferência.
Neste ano, o governo decidiu fazer concessões e aceitar o modelo proposto. No relatório final, aprovado no último sábado (13) por líderes de quase 200 nações, ficou, enfim, definida a criação de um sistema internacional para o mercado de carbono – os detalhes dessa operação ainda serão combinados.
Na cúpula, o Brasil também se comprometeu, ao lado de mais de cem países, a reduzir em 30% a emissão de metano até o fim da década, na comparação com 2020. O País é o quinto maior poluidor com metano do globo, atrás de China, Rússia, Índia e EUA. Dessa lista, só os norte-americanos também firmaram o compromisso.
Para dar conta da meta, será necessária uma ação de impacto em uma das principais atividades econômicas do País: a agropecuária. Conforme dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima, o ramo foi responsável por mais de 70% das emissões de metano no Brasil entre 1990 e 2019. Desse total, 97% das emissões foram por fermentação entérica, ou o arroto do boi.
Na falta de amplas regulações internacionais, o que se vê são acordos voluntários ou políticas feitas por empresas comprometidas a compensar suas emissões. Uma das principais referências é o GHG Protocol, ferramenta que ajuda a gerenciar as emissões responsáveis pelo aquecimento global e que caracteriza as emissões em três escopos. O tipo 1 é relacionado às emissões da própria instituição, como os veículos controlados por uma empresa. O escopo 2 trata da difusão de gases provenientes do consumo de energia elétrica ou térmica. Já o 3 lida com emissões indiretas ligadas às operações da companhia, como descartes de resíduos, deslocamentos de colaboradores, aquisição de matérias-primas e logística de distribuição de produtos.
A Vale, por exemplo, pretende investir US$ 6 bilhões para, até 2030, reduzir em 33% suas emissões de carbono classificadas nos escopos 1 e 2 do GHG Protocol. Em relação ao escopo 3, a empresa se comprometeu a reduzir 15% até 2035. Atualmente, 98% das emissões de CO2 da companhia são provenientes do escopo 3. “Só para dar uma ideia do tamanho da questão, isso representa cerca de 90 milhões de toneladas de CO2. É o equivalente às emissões de um país como o Chile”, diz Hugo Barreto, diretor de Sustentabilidade e Investimento Social da Vale.
Já a Klabin anunciou, em 2020, uma agenda relacionada a questões ambientais, sociais e de governança – o tripé conhecido pela sigla em inglês ESG. Foram definidos 11 temas a serem trabalhados até 2030, como segurança operacional; promoção da diversidade; e proteção da biodiversidade, com projetos de recuperação de áreas degradadas.
“As empresas atentas estão enxergando esse movimento histórico, cultural e comportamental. Não quero ser utópico de falar que as empresas serão o grande centro para resolver problemas sociais, mas, hoje, há um processo de escuta diferente da sociedade civil”, afirma Cristiano Teixeira, diretor-geral da Klabin.
Os cinco vilões
Dióxido de Carbono (CO2)
Também conhecido como gás carbônico, compreende 74% das emissões de gases do efeito estufa. É proveniente da queima de combustíveis fósseis – como carvão mineral, petróleo e gás natural – utilizados em geração de eletricidade e calor, transporte, indústria e consumo. Também é produzido em queimadas e desmatamentos.
Metano (CH4)
Produzido pela decomposição da matéria orgânica, abundante em aterros sanitários, lixões e reservatórios de hidrelétricas. Também é emitido durante o processo digestivo do gado e por fenômenos naturais, como a atividade de vulcões. Há uma quantidade gigante de metano retida em geleiras do Ártico, que pode chegar à atmosfera com os derretimentos causados pelas mudanças climáticas.
Óxido Nitroso (N2O)
É o terceiro gás que mais contribui para o aquecimento global e com maior efeito na degradação da camada de ozônio. A agricultura é responsável por 66% da emissão anual do gás, por meio da aplicação intensiva de fertilizantes nitrogenados. Também é produzido na queima de combustíveis fósseis e nas emissões geradas pela indústria química.
CFCs
Utilizados em geladeiras, aparelhos de ar-condicionado, isolamento térmico e espumas, os CFCs tornaram-se bastante conhecidos pelos dados à camada de ozônio, o que ocasionou sua redução drástica durante os anos 1990 e 2000. Entretanto, em 2018, a Agência de Pesquisa Ambiental, no Reino Unido, rastreou uma nova onda de emissão dos gases e estima que eles podem vir de fábricas da China. O caso está sob investigação.
Vapor d’água
Absorve parte da radiação emanada pela Terra e é um dos maiores contribuintes para o aquecimento natural do globo. Considera-se que, com mais calor, haverá mais evaporação de água – e, consequentemente, uma maior participação do vapor d’água no aumento do efeito estufa.
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