O Setor Elétrico, pela relevância para o desenvolvimento nacional e a vida de cada cidadão, ocupa relevante espaço na agenda pública. Por isso, as decisões que impactam o destino do Setor precisam ser discutidas em ambiente que privilegie a transparência e a participação de todos os envolvidos no processo regulatório.
O papel do regulador, nesse ambiente, é definir as regras, respeitando suas atribuições, manter a previsibilidade e a estabilidade e fazer cumprir o que foi fixado como resultado de profundo e extenso debate com todos os envolvidos: consumidores, agentes, investidores, sociedade de modo geral. Para tanto, o diálogo é fundamental.
O zelo por esse diálogo assegura ao regulador a confiança daqueles que são impactados pelas decisões, requisito imprescindível para garantir a realização dos investimentos necessários à adequada prestação dos serviços públicos de energia, que, no segmento de distribuição, ocorre mediante a remuneração por meio de tarifa adequada, calculada com a utilização das melhores técnicas de regulação econômica.
Este é o conceito de modicidade tarifária, que não significa tarifa baixa a qualquer custo, mas sim que considere a necessidade de remuneração dos investimentos prudentes realizados em ativos e as possibilidades de pagamento dos consumidores em patamares por estes aceitáveis.
Mas a tarifa adequada definida pelo regulador só é bem assimilada pelo consumidor se este receber serviço de qualidade. Logo, devem ser fortalecidas e estimuladas iniciativas regulatórias como as já protagonizadas pela ANEEL, no sentido de elaborar rankings de qualidade do serviço prestado pelas distribuidoras e do atendimento prestado pelas ouvidorias das concessionárias.
Outra questão que merece destaque é o prêmio aos concessionários de distribuição por conta da percepção do consumidor pelo serviço prestado: trata-se do Índice ANEEL de Satisfação do Consumidor (IASC). Além disso, de modo inovador, baseada em modelo desenvolvido pelo órgão de regulação de energia do Reino Unido, a Agência criará comissão técnica, para avaliar os regulamentos sob a ótica dos consumidores.
Por tudo isso, o cenário do Setor Elétrico é desafiador. Não somente pelas questões apresentadas, mas também pela necessidade de corrigir distorções que impedem que o serviço de energia seja prestado adequadamente em várias localidades do País, especialmente nas distantes dos grandes centros, e pela necessidade de ter de se preparar para o desenvolvimento de tecnologias disruptivas que emergem mais fortemente a cada dia, podendo tornar obsoletas tecnologias e regulamentos que hoje são atuais e funcionam corretamente.
Nesse sentido, deve-se preparar o mercado e a regulação para a expansão do uso dos veículos elétricos, que deverão também conviver com os tradicionais, assim como para a da geração distribuída, com painéis solares proliferando nas cidades e no campo, compatibilizando a convivência com o modelo tradicional de distribuição.
Essa modalidade de geração, instalada diretamente nos centros de carga, como nos telhados de residências e comércios, já conta com 350 MW, distribuídos em mais de 42 mil consumidores em todo o país, e se desenvolve com pujança, acompanhada de cada vez mais adesão da população e da indústria brasileira ao uso das fontes eólica e fotovoltaica.
Outros imensos desafios que exigirão atuação da ANEEL residem na atual judicialização do Setor, na integração dos serviços de distribuição com tecnologias de automação e telecomunicação, na ampliação do mercado livre e na conciliação da constante inovação promovida pelo Setor com as legítimas preocupações sociais com sustentabilidade, meio ambiente e comunidade.
Para assegurar a estabilidade do Setor nesse ambiente de tamanhas inovações, é importante que a ANEEL esteja alinhada na governança interna. Em 2018, dois novos diretores, de reconhecida capacidade técnica, tomaram posse, para exercer mandatos na Agência, recompondo a Diretoria da ANEEL. Em agosto, termina o mandato dos demais diretores, movimentação que acabará por imprimir à ANEEL nova feição, que certamente será pautada pelo respeito ao espírito de colegiado e às conquistas já alcançadas pela Agência.
Nesse sentido, o Planejamento Estratégico da ANEEL, ciclo 2018-2021, elaborado após exaustivo processo de discussões internas e externas, define perfeitamente os valores que a Agência incorporou e pretende seguir adotando nos próximos anos: autonomia, compromisso com o interesse público, diálogo, efetividade, equilíbrio, ética, imparcialidade, isonomia, previsibilidade, simplicidade e transparência.
Tais palavras guardam profundo sentido na rotina dos colaboradores da ANEEL e devem continuar alicerçando as decisões na regulamentação, na fiscalização, na mediação dos conflitos e na concessão das outorgas. Esses colaboradores devem se sentir capacitados e motivados para continuar prestando serviço público de excelência, o que constitui desafio motivador sob a ótica da gestão de pessoas.
Soma-se ao Planejamento Estratégico a utilização de boas práticas, a exemplo da Análise de Impacto Regulatório, que apresenta estudos que embasam a opção normativa, e da Agenda Regulatória, que garante previsibilidade sobre os temas a serem endereçados pelo regulador a cada biênio.
Além dessas práticas, o respeito às instituições e à transparência, bem como a busca incessante pelo interesse público, são constantes na atuação da ANEEL e devem conduzi-la a patamares ainda mais elevados na prestação de serviços ao longo dos próximos anos. Ao contar, como principal ativo, com um corpo extremamente qualificado de agentes públicos, a ANEEL continuará demonstrando estar à altura de exercer seu papel.
André Pepitone da Nóbrega é Diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL e Presidente da Associação Ibero-americana de Entidades Reguladoras de Energia – ARIAE
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