Com o intuito de induzir o campo da inovação no setor elétrico brasileiro, a Agência Nacional de Energia Elétrica pretende realizar uma chamada estratégica e prioritária para que os agentes possam utilizar recursos dos Programas P&D e Eficiência Energética em projetos de Redes de Inovação Aplicado à Mobilidade Elétrica, tema definido pela Agência para essa primeira experiência.
O anúncio foi realizado durante workshop promovido pelo Gesel/UFRJ na última sexta-feira, 15 de junho, onde o Especialista em Regulação da Aneel, Fernando Campagnoli, apresentou o esqueleto da nova modalidade, que possui conteúdo e tipologia diferente do tradicional programa P&D da Agência, que nasceu engessado e é ligado a fundos setoriais e editais, e não aos recursos de eficiência energética.
Por sua vez os projetos ligados a Redes de Inovação do Setor Elétrico – RISE devem obrigatoriamente passar pela cooperação entre grupos industriais com centros de pesquisas e empresas, alterando assim a estrutura de como pensar e empreender esses negócios, e consequentemente à definição das questões regulatórias.
“Esses componentes integrando uma rede dariam a garantia, um lastro de que esse recurso teria uma saída por meio de uma aplicação direta de comercialização no mercado”, pontuou Campagnoli, afirmando que o processo de inovação em redes é coletivo, mas nem sempre compartilhado: “Tem que ter aplicabilidade para que o conhecimento vá para o mercado, e para que o dinheiro investido se torne outro produto na outra ponta. Para tal, precisamos de um modelo sustente essas questões”, completou.
Durante a apresentação, foi reiterado que os interessados poderão participar simultaneamente tanto da chamada P&D quanto PEE, desde que haja a adequação aos pontos de cada uma. Também fica a cargo dos participantes buscarem contrapartida de outros atores, com recursos e financiamentos para projetos de maior envergadura:
“As concessionárias devem definir as próprias redes e sua rota tecnológica: elas seriam o hub principal dessa rede, que pode permitir uma melhor aplicação dos recursos, dando um resultado mais eficaz para a sociedade no final do processo”, ressaltou o especialista.
Perguntado sobre o processo de avaliação das propostas, visto o desenvolvimento da inovação em redes não acontecer de forma linear como os outros programas, ele afirmou que a análise dos projetos será feita com outros olhos pelo órgão regulador, que poderá inclusive realizar avaliações parciais ao longo dos projetos. “Podemos realizar reuniões de acompanhamento das tecnologias, como por exemplo no caso das startups, que podem alterar seus processos conforme o andamento de um projeto”, contou.
Para a Aneel, o momento é de ouvir os agentes e discutir as questões pertinentes, ajustando os pontos para, em um ou dois messes, colocar uma minuta em consulta pública por 45 dias, para que os interessados na discussão podem se manifestar.
A Agência também informou que irá publicar uma norma técnica em seu site, um relatório completo do que já foi conversado e o que aconteceu de avanço até o momento, visando agilizar o lançamento da chamada e o início dos projetos para 2019.
“Faremos uma síntese das contribuições, analisando o que é cabível para colocar no documento final. A ideia é que consigamos fazer todo esse processo até o final do ano, para que os projetos comecem de fato a partir do segundo semestre do ano que vem”, revelou Campagnoli.
Eletromobilidade é o tema da vez
O assunto entorno da RISE aplicada à mobilidade elétrica começou em agosto do ano passado, durante o Citenel em João Pessoa (PB), quando a Aneel se reuniu com alguns dos principais grupos do setor para conversar e debater experiências e os próximos passos para a regulação da nova chamada.
Entre as principais apresentações, Itaipu falou sobre seu parque tecnológico junto com a UFPR e empresas de energia fotovoltaica. A Abinee tratou das possibilidades da eletromobilidade para as empresas e a Abrace discorreu sobre impactos, desafios e expectativas com a inovação.
Desta reunião e a partir de outros encontros formou-se a construção de um plano temático, com o levantamento de sete subtemas a serem tratados para o avanço da mobilidade no país: eficiência energética em todos os processos; integração das fontes renováveis às novas tecnologias e a rede; a questão dos veículos leves e pesados; o compartilhamento da infraestrutura; armazenamento voltado à mobilidade, no caso as baterias; funcionamento e estrutura da nova rede, e por fim as medidas regulatórias, com a definição de uma agenda estratégica.
A partir destas discussões iniciais surgiram algumas resoluções, como a criação de um fórum para aquecer o debate, a promoção de estudos específicos, como por exemplo no desenvolvimento de baterias, e o uso da tecnologia Smart Grids, com inteligência e organização para os projetos.
Além da criação de um mapa de competências técnicas, da proposição de políticas públicas e da busca por parcerias internacionais, também foram colocadas questões sobre como ficaria o mercado livre e a estrutura tarifária, bem como a propriedade intelectual com tantas ideias e produtos disseminados em rede. Mas talvez nenhum ponto seja primariamente tão importante quanto a de se encontrar modelos econômicos que favoreçam e sustentem essas propostas.
Fernando Campagnoli destacou a importância da integração dos setores Elétrico com o de Transportes e a receptividade aos novos atores nos negócios: “Já estamos conversando com a ANP para discutir as regulamentações e legalidades necessárias para essa conexão. Teremos uma série de novos players, que terão que ser considerados para a regulação”.
Para ele, ainda que a questão da eletromobilidade esteja muito atrasada no Brasil, com uma “defasagem quanto a tecnologias e a infraestrutura”, o segmento elétrico tem uma vantagem competitiva em relação a outros setores, que não possuem garantias de recursos para programas deste tipo.
“O setor elétrico é encapsulado, conservador, com uma herança monopolista. Mas ao mesmo tempo é inovador, sustentando-se há tempos. Nessa questão da RISE o papel da Aneel é induzir o campo, não atrapalhar. Quem tem que fazer a rede são as empresas”, apontou.
O especialista enxerga a regulação de políticas como um desafio, pois, além do assunto possuir um espectro amplo e complexo com a estrutura de atuação em redes, ele depende também da cooperação de mais agentes e de forças de mercado e outras ordens: “Políticas públicas integradas na verdade é um sonho nosso, porque hoje é política mãe comendo política filha”.
Na visão do assessor da Diretoria de Operações Indiretas do BNDES e colaborador da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI, Samy Kopit Moscovitch, o sucesso da mobilidade elétrica no país depende da efetivação de um conjunto de políticas públicas, tanto para a produção quanto para o consumo: “Não são questões triviais. A eletromobilidade tem diversas dimensões. Por exemplo na China, há muitos incentivos para não se utilizar os carros convencionais”, ponderou.
Ainda não é possível dimensionar o quão relevante e complexo será a efetivação desses projetos de convergência em rede para a sociedade. Por ora, a questão que fica não é apenas em como induzir a inovação, mas como manter esse organismo com vida, já que “a onda da mobilidade vai chegar e nós temos que nos adaptar a isso”.
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Fonte: Valor Econômico.
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