A proposta do governo de apresentar um projeto de lei no Congresso para discutir um novo modelo para o setor elétrico é extremamente oportuna.
Ainda mais quando a matriz brasileira sofreu grande modificações. Nos primeiros anos da década de 2000, as hidrelétricas eram responsáveis por quase 95% da geração de energia no Brasil; agora, por cerca de 65%, com a entrada de térmicas e renováveis como a eólica.
Foram listados pelo governo 19 pontos que precisariam ser discutidos na elaboração da nova legislação. Mesmo reconhecendo a importância desses pontos, achamos que faltaram alguns:
Os estudos de planejamento de expansão são indicativos, mas devem apontar a matriz energética ótima. Como definir os critérios para o estabelecimento de tal matriz? E como assegurar que os resultados dos leilões de energia se afastem o mínimo daquela matriz?
Quais as alterações no modelo que serão necessárias para assegurar que haverá expansão de oferta de energia no mercado livre? Na proposta do governo, prevê-se a expansão do mercado livre até 2030 para cerca de 70%. Como assegurar a oferta de energia? As regras puras de mercado funcionarão para tal expansão, de forma adequada?
Como fazer com relação à (desejável) proliferação de fontes renováveis, que são intermitentes? E com relação à expansão da geração distribuída?
Como compatibilizar melhor os leilões de energia com os requisitos de leilões de transmissão?
Como fazer as tarifas de transmissão produzirem sinais econômicos para a melhor localização de novas fontes?
Como compatibilizar horizontes de leilão e durações de contrato com os requisitos de fornecedores de combustíveis, que são agentes externos ao setor?
De que forma pode-se assegurar financiabilidade aos projetos de geração, tanto no mercado regulado quanto, principalmente, no mercado livre?
Qual o tratamento a ser dado a usinas descontratadas, sem políticas intervencionistas?
Qual o tratamento específico a ser dado ao Centro de Pesquisas da Eletrobras (Cepel), no sentido de assegurar a permanência de tão importante função de pesquisa e desenvolvimento (P&D)? Por exemplo, por que não repensar as funções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) — passando algumas atribuições ao Operador Nacional do Sistema (ONS), e incorporar o Cepel à EPE, dando à função de P&D a importância merecida?
Um ponto de extrema relevância, que deveria ser observado de imediato, diz respeito à efetiva participação dos agentes setoriais nos estudos e discussões referentes ao planejamento, à operação, e à comercialização de energia. Atualmente, tais funções são realizadas pela EPE, ONS e Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), respectivamente, com a regulação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Mas pode-se verificar que não há participação efetiva dos agentes setoriais nas principais áreas de atuação das entidades. Com efeito, o ONS tem um conselho de administração sem nenhuma ingerência técnica, apenas administrativa; a EPE dispõe de um conselho consultivo, onde são apresentadas questões específicas, mas sempre sem direito à participação dos agentes nas decisões importantes. A CCEE dispõe de assembleia geral com reduzida participação dos agentes em decisões, geralmente de responsabilidade da Aneel.
Modernizar o setor envolve a alteração do modelo em tópicos extremamente relevantes e de difícil consenso pelos diferentes agentes. Mas, com certeza, o governo tem toda a razão de procurar a solução possível numa ampla discussão. E o lugar apropriado é o Congresso.
Associe-se e conheça a Área do Associado, um espaço aonde você tem acesso a estudos, apresentações, documentos dos principais órgãos do SEB e mais! Não perca tempo e entre em contato!
Fonte: O Globo.
No comment