São Paulo – A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) dará prioridade absoluta neste ano a uma tentativa de acordo para pôr fim a uma longa e bilionária disputa judicial em torno do déficit de geração registrado pelas hidrelétricas brasileiras, disse à Reuters o presidente do conselho da instituição.
A briga, que impacta o mercado de eletricidade desde meados de 2015, teve início após geradores obterem decisões judiciais para se proteger de perdas financeiras devido a uma menor produção de suas usinas, que tiveram a geração ofuscada por termelétricas acionadas para preservar os reservatórios em meio a chuvas abaixo da média.
O embate tem gerado elevados valores em aberto nas liquidações financeiras do mercado de curto prazo de eletricidade, que promovem pagamentos e recebimentos entre as empresas que atuam no setor elétrico e são realizadas mensalmente pela CCEE.
Em fevereiro, quando foram processadas operações de dezembro, a CCEE arrecadou apenas 21 por cento dos 2,4 bilhões de reais cobrados dos agentes de mercado.
Dos valores em aberto, cerca de 1,62 bilhão foram devido a liminares que protegem empresas dos débitos com o déficit hídrico, conhecido no setor pelo termo técnico “GSF”.
“Nosso principal problema, e a prioridade número um da CCEE, é a questão do GSF”, disse à Reuters o presidente do conselho da Câmara, Rui Altieri.
Ele explicou que a CCEE e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) chegaram a uma proposta de acordo para acabar com a disputa e o assunto está sendo discutido junto às empresas envolvidas.
A proposta em jogo, segundo ele, envolve a regulamentação de uma regra para compensar parcialmente no futuro os riscos de a geração hidrelétrica ser deslocada pelo acionamento de usinas térmicas mais caras, a chamada geração fora da ordem de mérito.
Em troca de uma melhor definição sobre como essas eventuais perdas de geração seriam tratadas, as elétricas precisariam aceitar retirar suas proteções judiciais e parcelar a dívida já existente em torno do GSF. Também haveria uma compensação às empresas por meio de uma extensão dos contratos de concessão das hidrelétricas envolvidas.
“Seria uma extensão de, em média, entre um ano e meio e dois anos”, disse Altieri.
Ele afirmou que o assunto será alvo de uma audiência pública a ser aberta pela Aneel antes de um acerto final.
“Estamos fazendo interações junto aos agentes para ver o que conseguimos avançar, é um tema complexo… a expectativa é que essa questão seja bem encaminhada ao longo deste ano”, disse.
Na semana passada, executivos da geradora AES Tietê disseram que a empresa é uma das protegidas de débitos com o GSF por liminar. A elétrica tem provisionado os valores envolvidos na disputa, que já chegam a 315 milhões de reais.
“Estamos trabalhando com outros grupos do setor, tentando chegar a algum tipo de acordo”, disse o presidente da AES Brasil, Julian Nebreda, em teleconferência.
Em 2015, a disputa judicial sobre o déficit das hidrelétricas chegou a envolver quase 3 bilhões de reais, mas o governo negociou um acordo para que parte das elétricas envolvidas retirasse as liminares judiciais e parcelasse as dívidas.
O acerto teve sucesso com geradoras que haviam negociado energia com distribuidoras, mas travou entre os agentes que comercializaram a produção no mercado livre de energia, que mantiveram as ações na Justiça desde então.
“Naquele momento, foi o acordo possível”, disse Altieri.
Inadimplência
A CCEE também espera ver resolvida em breve a inadimplência de três distribuidoras de eletricidade que não têm honrado seus compromissos nas liquidações financeiras do mercado de energia elétrica: a estatal do Amapá, CEA, e empresas de Rondônia e Piauí controladas pela Eletrobras.
Altieri lembrou que essas empresas estão em preparação para privatização e, com isso, devem ter acesso a fundos setoriais para quitar suas dívidas.
“Temos conversas constantes com eles e com o regulador (Aneel)… tem uma promessa da agência de regularizar essa questão no curto prazo, de 60 a 90 dias”, disse.
Mercado livre desacelera
O dirigente da CCEE afirmou ainda que o mercado livre de energia deve continuar em expansão em 2017, mas em menor ritmo que no ano anterior, quando 2,3 mil empresas aderiram ao segmento –aumento de 25 vezes ante 2015.
No mercado livre, grandes consumidores podem negociar contratos de energia diretamente com geradores e comercializadoras.
“No ano passado, recebíamos em torno de 250 a 300 pedidos de adesão (ao mercado livre de energia) por mês. Em janeiro e fevereiro, a média foi de 100… continua elevada, mas não tão forte como no passado.”
O menor fluxo está atrelado, em parte, à expectativa de preços mais elevados no mercado livre neste ano que em 2016.
Fonte: Exame
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