Análise: O que Wilson Ferreira Jr. vai encontrar quando chegar na Eletrobras

Wilson Ferreira Jr. é um executivo premiado por publicações que possuem edições dedicadas a melhores executivos, pela gestão à frente da CPFL Energia, conhecido por suas ações e posições pró-eficiência e com amplo conhecimento do mercado financeiro e suas engrenagens. A CPFL Energia cresceu a partir de operações estruturadas de crédito e financiamento, soube aproveitar-se de situações de mercado e exerceu papel de consolidador – como é público e notório — em aquisições como distribuidoras do interior de São Paulo e empresas de geração renovável, como a Ersa e a Dobrevê (Desa), ambas consolidadas nas asas da CPFL Renováveis.

 

Talvez um dos poucos (senão o único) fracasso dele foi não conseguir arrematar as distribuidoras da combalida Rede Energia, ao ser surpreendido por uma ofertante de última hora, a Energisa, tirando do executivo a chance de presidir o que seria o maior grupo privado de distribuição do país com folga.

 

Pois bem: depois de deixar a companhia que geriu por 18 anos, Ferreira Jr deixa a companhia em julho, em direção à Eletrobras, casa que, no momento, parece ser o oposto do que o executivo sempre pregou. Ao ser convidado pelo presidente interino, Michel Temer, Ferreira Jr pode ter sido motivado pelo desafio (que talvez já não encontrasse por lá) de reestruturar uma empresa complexa e em dificuldades financeiras e gerenciais.

 

Caso aceite o convite, ao que tudo indica, a lista de medidas que o executivo terá ao trocar Campinas pelo Rio de Janeiro será muito grande. A estatal possui uma relação pendências que precisam ser resolvidas com certa rapidez, diante de uma forte demanda pela melhoria da governança e da gestão. Eis o que espera Ferreira Jr. a partir do momento em que se sentar na cadeira de presidente da maior empresa de energia do país, cuja sede se localiza na esquina das avenidas Presidente Vargas e Rio Branco, uma das principais da cidade.

 

Resolver a dívida com compra de combustível para o sistema isolado

 

O governo federal aprovou a injeção de R$ 3,5 bilhões do Tesouro para ajudar a empresa a quitar a dívida da estatal com a BR Distribuidora, situada entre R$ 9 bilhões e R$ 10 bilhões. Além disso, a MP 706 limitou o uso da CDE para o ressarcimento da dívida com combustíveis, a partir de um veto a uma das propostas. É a decisão sobre como repactuar essa dívida, que ficará a descoberto da CDE que vai definir o tamanho da necessidade de aportes de capital que a Eletrobras ou o governo vai ter que fazer nas empresas, bem como decidir se vende todas as distribuidoras, algumas ou se mantém o controle sobre elas.

 

A deslistagem das ações nos EUA

 

Dias depois do ministro de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho, assumiu o cargo, encerrou-se o prazo para a estatal apresentar o balanço de 2014 para a SEC (a CVM americana). A Eletrobras devia o arquivamento porque a KPMG, auditora contratada pela companhia, se recusava a assinar o balanço diante das incertezas sobre os impactos das irregularidades encontradas pela Operação Lava-Jato sobre as finanças. O processo ainda está na fase de recursos e Ferreira Jr. chega para, inicialmente, dar um choque de credibilidade para a Eletrobras, já que mesmo que volte a negociar ações na Bolsa de Nova York, não terá o desempenho que possuía antes das investigações.

 

As investigações da Operação Lava-Jato

 

O grande foco das investigações federais é a Petrobras, como se nota nas centenas de delações premiadas e nos diversos processos em andamento na Justiça. Mas as apurações também encontraram irregularidades em projetos do setor elétrico, todos eles com participação da estatal, especialmente na hidrelétrica de Belo Monte e na usina nuclear de Angra 3.

 

Por causa disso, a Eletrobras contratou o escritório internacional de advocacia Hogan Lovells e formou uma comissão de investigação liderada pela ex-ministra do STF Ellen Gracie. A magnitude das ações ilícitas, aparentemente, é infinitamente menor na Eletrobras, uma vez que muitos projetos são concedidos a empresas privadas, com as quais a Eletrobras atua como sócia minoritária, mas as atuações oficiais derrubararam um presidente de subsidiária e pelo menos dois diretores, um deles da própria holding.

 

As tarifas de geração das usinas com concessão renovada em 2012

 

Uma das principais causas da deterioração dos indicadores financeiros da Eletrobras, a MP 579, que renovou antecipadamente, em 2012 as concessões de hidrelétricas, gerou prejuízos sucessivos à companhia e distorceu a estrutura tarifária, pois a redução nas tarifas de energia acabou anulada pela crise hídrica que já se anunciava naquele ano. Há uma sinalização de que os preços praticados pelas usinas da Eletrobras, repassados aos consumidores por meio das cotas, podem ser revistos. A companhia espera ainda a definição dos critérios de indenização dos ativos não totalmente amortizados, o que pode atenuar, em parte, os problemas de caixa.

 

A privatização das distribuidoras e a reestruturação das subsidiárias

O que é tido como fato consumado é que as distribuidoras serão vendidas. A Celg Distribuição está com o processo mais adiantado (o próprio Ferreira Jr. disse que a CPFL não compraria se o preço de venda de R$ 2,8 bilhões fosse mantido), mas ainda depende de algumas decisões antes de se efetivar. Se realmente avançar, Ferreira Jr. vai enfrentar o descontentamento dos opositores da privatização, além do próprio processo de saneamento financeiro, já que essas empresas estão muito deficitárias e possuem sérios problemas operacionais, ainda que a Eletrobras já estivesse atuando para saná-las.

 

Mas a reestruturação deve passar pelas grandes empresas da companhia, como Furnas, Chesf e Eletronorte, atingidas pelas indicações políticas que influiram no desempenho das companhias. Como exemplos, Furnas foi "dividida" por grupos políticos (cujos bastidores começaram a vir à tona a partir de delações premiadas), enquanto a Chesf foi vetada de novos leilões de transmissão por causa de atrasos em obras de implantação de conexões para um grande número de eólicas no Nordeste.

 

A Eletronuclear vive a pior crise de imagem desde sua criação e mesmo a pequena CGTEE também tem problemas com o complexo térmico a carvão de Candiota. Além disso, áreas semelhantes das subsidiárias não se conversam. Basta recordar que a implantação da nova marca Eletrobras (que colocou o nome da holding à frente das subsidiárias) não emplacou por resistência interna.

 

São Luiz do Tapajós

 

A usina que pode ser o último grande aproveitamento em exploração no país, está sob suspensão com a decisão do governo de suspender o licenciamento prévio com a publicação de um parecer da Funai em que considera a área onde está prevista a instalação da hidrelétrica como sendo terra indígena. A usina tem potência instalada projetada de 8.040 MW e está localizada numa região onde há dificuldades estruturais. São Luiz do Tapajós seria a primeira hidrelétrica que seguiria o conceito de usina-plataforma, de implantação com o menor impacto ambiental possível, sem permitir a formação de aglomeração urbana no entorno.

 

O problema é que essa definição do que seria uma usina-plataforma nunca ficou clara. Além disso, os problemas que ainda decorrem da instalação de Belo Monte ainda não foram totalmente resolvidos, o que ajuda a criar mais resistência contra a usina, cujos estudos ambientais estão sendo conduzidos por um grupo de empresas, com coordenação da Eletrobras.

 

Angra 3

Custos crescentes, propina para empreiteiras, paralisação das atividades e acusação de formação de cartel para fornecimento da montagem eletromecânica, entre outros problemas, são as barreiras que impedem que a usina de Angra 3 seja considerada um dos melhores investimentos da Eletrobras.

 

Depois de cerca de 20 anos de obras paralisadas, mesmo estando com os equipamentos comprados, a usina que estava saindo do papel até virem a público as investigações que derrubaram um presidente e alvejaram as empresas que a implementavam não deve ficar pronta antes do fim da década. Ferreira Jr. terá que buscar uma saída para a retomada das obras da usina e evitar ainda mais a depreciação que ela vem causando às finanças da Eletrobras.

 

Fonte: Brasil Energia

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