Solução para sobrecontratação de distribuidoras exige alteração no modelo setorial

A audiência pública 12/2016, cujo prazo para contribuições terminará na próxima segunda-feira, 21 de março, e trata da sobrecontratação das distribuidoras é vista como uma solução de alcance restrito no setor elétrico. Por se tratar de um pequeno aperfeiçoamento na Resolução Normativa 508/2012 da Aneel é uma ação de curto prazo. O avanço das sobras das distribuidoras com a atual perspectiva de demanda em baixa associado às transformações pelas quais o mercado tem passado com o avanço da migração do mercado regulado para o livre, a perspectiva de crescimento dos sistemas de micro e minigeração e uma eventual redução dos limites para consumidor livre ou especial, leva à necessidade de uma mudança mais estrutural no sistema. E essa solução passaria não somente pela Aneel mas também pelo Ministério de Minas e Energia.

O volume de sobras ainda é incerto e os cálculos de especialistas na área apresentam números diferentes. De acordo com a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, esse número médio é de 107%.
Na avaliação da consultoria PSR somente a audiência pública não será suficiente para resolver o problema da redução da demanda no mercado regulado, que classifica como sistêmica. E lembra que, além do cenário de intensa migração para o mercado livre, o mecanismo de compensação de sobras e déficits não deverá ser eficiente porque para que funcione deve existir distribuidora com déficit contratual. Já os demais mecanismos de redução de contratos são todos baseados na redução dos acordos de energia existente, cujo volume hoje é muito baixo em função da transformação de grande parte desse insumo em cotas de garantia física. E que isso indica que serão necessárias mudanças mais profundas nas regras que regem a contratação de energia por parte das distribuidoras e seu repasse às tarifas dos consumidores finais. Dessa forma permitira às concessionárias lidar com a redução súbita da demanda e com as sobras contratuais decorrentes.
 
A consultoria aponta a necessidade de que seja implementado um mecanismo centralizado de redução concomitante de oferta e volumes contratados. Segundo o especialista da área regulatória da PSR, José Rosenblatt, essa centralização vem do fato que os contratos já foram licitados de forma centralizada e submetidos a vários MCSDs centralizados. Além disso, também passaram por adiamentos, alterações e implementações de maneira centralizada. “Seus custos são repassados aos consumidores cativos sem discussão, desde que os volumes contratados estejam dentro dos limites regulamentares”, explicou o executivo. “Em suma, os contratos não são bilaterais, e nessas circunstâncias, não parece razoável alocar unicamente a redução, adiamento ou rescisão dos contratos um caráter bilateral, com negociação entre partes. Se tudo mais nesses contratos é centralizado, então, em princípio, um eventual mecanismo de redução também deveria sê-lo”, acrescentou.
 
Na avaliação da Thymos Energia pelo menos no curto prazo essa audiência pública poderá trazer um alívio para os distribuidores e geradores que podem dessa forma evitar uma alta penalização. Contudo, ele concorda que as medidas propostas não deverão ser suficientes para o cenário de longo prazo, ainda mais com a situação macroeconômica.
“À medida que se tem esse cenário de retração da economia a sobra estrutural é gigantesca. Mesmo com os novos mecanismos não se segura no longo prazo, a adoção de novos instrumentos de alocação dessa sobra ao mercado livre seria interessante e traria maior oferta e redução de preços”, comentou o consultor da Thymos, Ricardo Savoia. Para ele, esse assunto abre espaço para uma nova audiência pública com a meta de discutir os caminhos da sobrecontratação à luz da ampliação do mercado livre.
 
Leontina Pinto, diretora da Engenho, lembra que essa situação de sobrecontratação veio em parte pela redução espontânea da demanda por conta das dificuldades econômicas com o desemprego e a falta de confiança das pessoas. E afirmou que essa posição é momentânea, afinal, a reação para a retomada é dinâmica, apesar de não ser imediata. Contudo, há um segundo ponto, que é a ampliação da migração para o mercado livre por parte de consumidores potencialmente livres. “Essa demanda é estrutural e não volta assim tão cedo”, destacou.
 
Ela concorda que esse aprimoramento em discussão é saudável para o mercado no curto prazo. Mas ressalta que o país precisa discutir alterações mais estruturais, inclusive a liberação do excedente das distribuidoras para ser vendido no mercado livre seria uma das opções viáveis por não afetar tanto o fluxo de caixa das distribuidoras, que têm que liquidar os excessos ao PLD e ao mesmo tempo injetando energia nova em um mercado que está em crescimento. Em sua opinião, o governo deveria agir nesse sentido, pois se há um desequilíbrio causado pela sua atuação é seu dever corrigir e trazer equilíbrio.
 
O presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia, Reginaldo Medeiros, destaca que o poder concedente deveria permitir que o mercado tivesse mais trânsito entre os agentes. Ele lembra que no leilão A-1 de 2015 a demanda das distribuidoras foi fortemente atendida por comercializadoras. “Hoje há um impedimento legal para se fazer negócios no sentido contrário do A-1. Deveríamos corrigir esse mecanismo para que as distribuidoras pudessem gerenciar esse risco e evitaríamos problemas como os atuais ao vender essa energia no mercado”, defendeu.
 
Medeiros faz coro ao afirmar que essa audiência deverá equacionar parte do problema, mas não corrige estruturalmente a questão que é de dar poder à distribuidora de gerenciar seu risco junto ao mercado. Um leilão público seria uma alternativa viável para a sobrecontratação.
 

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