A indicação de Nestor Cerveró para a diretoria financeira da BR Distribuidora, um esquema em Furnas, que seria comandado por Dimas Toledo, as obras da hidrelétrica de Belo Monte, um suposto esquema de aquisição de etanol pela BR Distribuidora, aquisição de máquinas da Alstom e interesse de empresas chinesas no Brasil. Todos esses temas, entre outros, fiz
eram parte da delação premiada de Delcídio do Amaral, senador que era Líder do Governo e foi preso como parte das investigações da Operação Lava-Jato.
Depois de solto, Delcídio pediu licença no Senado. As informações constam na íntegra da delação premiada do senador, divulgada nesta terça-feira, (15/3), depois de homologada pelo ministro Teori Zavaski, do STF e colocam aspectos de diversas áreas do setor energético à tona. Os depoimentos colhidos pelo Ministério Público ocorreram entre os dias 11 e 14 de fevereiro, em Brasília. Veja abaixo os principais trechos da delação. Para acessar a íntegra da delação premiada, clique aqui.
Nomeação de Nestor Cerveró para a BR Distribuidora – Delcidio contou aos procuradores que a presidente Dilma Rousseff, então ministra-chefe da Casa Civil, teve “atuação decisiva” na indicação de Nestor Cerveró para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora. Segundo ele, no dia da aprovação do nome de Cerveró pelo conselho da estatal, o senador recebeu ligações de Dilma sobre a indicação. Cerveró foi empossado no cargo em março de 2008.
Belo Monte (1) – Em um dos trechos da delação, os procuradores ressaltam a necessidade de se dar especial atenção da empresa Contern, pertencente ao grupo Bertin, no consórcio da hidrelétrica Belo Monte. A empresa, que está inadimplente na entrega de usinas contratadas em leilões de energia no passado, “tem uma longa história de negócios com José [Carlos] Bumlai, pecuarista conhecido pelo epíteto “amigo do Lula”. tais negócios envolvem as termelétricas, investimentos em óleo diesel no Nordeste do país e a usina sucroalcooleira São Fernando, atualmente em recuperação judicial.
“Bumlai também realizava um lobby agressivo com relação às termelétricas buscando perdão das dívidas de energia”, relatam os procuradores, acrescentando José Carlos Bumlai e seu filho Maurício ofereceram R$ 1 milhão como “prêmio”, em caso de êxito na “resolução do assunto”.
Belo Monte (2) – Em outro trecho da delação, Delcídio relata a formação de um novo consórcio para disputar o leilão da hidrelétrica de 11,2 mil MW, diante da desistência do consórcio que continha “as maiores empresas de engenharia do país”, de acordo com o documento. Na ocasião, a formação do consórcio, embrião da atual Norte Energia, foi composto por Chesf, Eletronorte, Queiroz Galvão, Galvão Engenharia, Contern (Bertin, que entrou via Bumlai), JMalucelli, Gaia Energia, Cetenco, Mendes Jr. Trading e Serveng-Civilsan, apresentando a única proposta e vencendo o leilão.
Na sequência, as empresas que desistiram do leilão formaram o consórcio construtor da usina. Na delação, afirma-se que houve pagamento de propina da ordem de R$ 30 milhões, que serviu como “contribuição decisiva” para as campanhas eleitorais de 2010 e 2014. Delcídio afirma ainda que os números finais de propina podem ter sido maiores, porque durante a campanha, em 2010, “houve acordo com relação a claims de cerca de R$ 1,5 bilhão, apresentadas pelo consórcio”.
Tal acordo, prossegue, era “uma das condições exigidas para aumentar a contribuição eleitoral das empresa
s”. Os procuradores listam ainda na delação que “a atuação do ‘triunvirato’ formado por Silas Rondeau, Erenice Guerra e Antônio Palocci foi fundamental para se chegar ao desenho corporativo e empresarial definitivo do projeto Belo Monte”. Rondeau foi ministro de Minas e Energia entre 2005 e 2007 e deixou o cargo após denúncias de envolvimento em casos de corrupção.
Além disso, os membros do MPF afirmam que o senador tem conhecimento de “ilicitudes envolvendo o fornecimento de equipamentos” para a usina. Uma forte disputa entre empresas chinesas (patrocinadas por Bumlai) e os fabricantes “nacionais” – Alstom, Siemens, Impsa e Iesa fez com que Rondeau, Erenice e Palocci afissem para que os fabricantes nacionais fechassem contrato, com reflexo na captação de recursos para campanhas.
Delcídio disse ainda que o ex-governador Eduardo Campos, morto em acidente aéreo durante campanha eleitoral em 2014, atuou em favor da Impsa, mas que ao longo do tempo, “ficou demonstrada inaptidão (…) em fazer frente a um desafio dessa envergadura”. O senador estima “contribuições ilícitas” entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões.
Esquema de Furnas – Delcídio afirmou aos procuradores que teve conhecimento de um “grande esquema de corrupção” em Furnas, operado por Dimas Toledo, classificado no texto como “experiente e competente profissional do setor elétrico”, confirmando menção feita em ocasiões anteriores pelo delator Alberto Yousseff, de participação do senador Aécio Neves (PSDB-MG), ainda de acordo com o documento. “Dimas Toledo era o operador do esquema de corrupção em Furnas pelo PSDB”, destaca o documento.
Na delação, o senador licenciado afirma que em uma viagem à Campinas o então presidente Lula perguntou sobre a atuação de Dimas. Delcídio respondeu que Dimas é um profissional do setor elétrico e questionou o porquê da pergunta do presidente. Lula, então, teria afirmado que o deputado José Janene, do PP, que morreu em 2010, Aécio Neves e “até o PT, que era contra, já virou a favor da permanência dele. Deve estar roubando muito”. O documento acrescenta que o senador sabia que Dimas “sempre teve informações relevantes de vários governos estaduais e federais, vez que era diretor de Engenharia de Furnas”.
André Esteves e a rede Aster de postos de combustíveis – Na delação, Delcídio contou que Lula pediu a intervenção do senador para pagamento de valores à família do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, também preso pela Lava-Jato. O documento dá conta de que o sócio e presidente do BTG Pactual, André Esteves, preocupado com eventuais implicações relativas ao envolvimento dele no caso, até aceitou colaborar com o repasse de valores, que totalizou R$ 250 mil, mas depois desistiu ao saber que o próprio Cerveró vinha fazendo.
“Em várias situações, manifestou grandes preocupações com o BTG, especialmente no que se refere à operação de embandeiramento de postos da rede Aster, de propriedade do empresário Carlos Santiago”, aponta o documento.
Arquitetos das “operações de propina” – Delcídio afirmou que entre as pessoas que atuaram em operações de cobrança de propina em contratos públicos estão Erenice Guerra, que trabalhou como consultora jurídica do Ministério de Minas e Energia; Silas Rondeau, ex-ministro que “passou a vocalizar os interesses do PMDB do Senado na área energética”. Antes do MME, Rondeau presidiu a Eletronorte e a Eletrobras. O senador contou na delação premiada que os principais protagonistas, também denominados “braços armados” foram o engenheiro Adhemar Palocci, diretor de Engenharia licenciado da Eletronorte, e Valter Cardeal, diretor de Geração da Eletrobras, também licenciado.
Etanol – Na delação, Delcídio revelou que o ex-diretor da BR Distribuidora João Augusto Henriques, preso em uma das fases da Operação Lava-Jato, foi operador de um esquema de aquisição ilícita de etanol na empresa entre 1997 e 2001, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, cujo apadrinhamento teria sido feito pelo atual vice-presidente, Michel Temer.
Alstom – A aquisição de máquinas para termelétricas não se deu sob a gestão de Delcídio do Amaral na diretoria da Petrobras. Segundo a delação, o senador disse que o contrato entre a termelétrica Termobahia e o consórcio OAS/Alstom foi assinado às pressas, na véspera da posse do senador na petroleira, por causa de interesses políticos baianos, representados pelo então ministro de Minas e Energia, Rodolpho Tourinho – que morreu em 2015.
Aliado do senador Antônio Carlos Magalhães, também falecido, Tourinho foi um dos responsáveis pela negociação de empréstimo para a obra no BID. As turbinas adquiridas apresentaram problemas operacionais em vários países do mundo. O senador afirmou aos procuradores que a obra rendeu ao antigo PFL baiano, hoje DEM, montante da ordem de US$ 10 milhões.
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