Operação contínua e preço alto ameaçam rombo nas térmicas

Depois das distribuidoras de energia e das geradoras hidrelétricas, agora são as termelétricas que correm o risco de registrar rombos financeiros por causa da explosão do preço de energia no mercado de curto prazo (spot). Levantamento inédito feito pelo Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da UFRJ, com coautoria do ex-diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, mostra que a combinação entre o elevado preço spot de energia e o acionamento contínuo das térmicas está fazendo com que os custos de operação dessas usinas eliminem, e em alguns casos superem, os ganhos obtidos por elas.

Considerando a operação de 47 térmicas, que somam capacidade instalada de 11.307 megawatts (MW), entre fevereiro e abril deste ano, o estudo mostrou que os custos operacionais dessas usinas totalizaram R$ 870 milhões. A cifra equivale a 63% da receita fixa total dessas térmicas no período, de R$ 1,37 bilhão. Desse conjunto, sete térmicas tiveram custos superiores à receita fixa no período analisado.

O problema, de acordo com o estudo, se deve ao fato de que essas térmicas não estavam previstas para operar continuamente. Por isso, além de um custo de operação e manutenção maior que o planejado, qualquer interrupção na geração obriga essas usinas a comprar energia no mercado spot para honrar seu compromisso.

“Em muitos projetos, o tempo de acionamento das térmicas no período 2012-2014 já superou a projeção original de acionamento para todo o contrato de 15 anos de duração”, dizem os especialistas no estudo, assinado também pelo coordenador do Gesel/UFRJ, professor Nivalde de Castro, e o pesquisador Roberto Brandão.

O trabalho também avaliou os custos de ressarcimento que as térmicas precisam pagar quando, ao serem despachadas, não produzem energia. Esse ressarcimento é indexado ao preço spot de energia, que hoje está em R$ 591,81 por megawatt-hora (MWh), valor já considerado alto para o período. Entre fevereiro e abril, a cifra, porém, permaneceu no teto regulatório, de R$ 822,83/MWh.

Com base nesses cálculos, o levantamento também analisou em quanto a remuneração do acionista dessas termelétricas é impactada pelos custos de ressarcimento. Estimando que a remuneração ao acionista (medida pelo conceito contábil de fluxo de caixa ao acionista) equivale a cerca de 20% da receita fixa desses empreendimentos, o estudo concluiu que, considerando um preço spot de R$ 500/MWh, o ressarcimento proveniente a um período de dois meses em que uma térmica, quando acionada, deixe de operar corresponde a 63 meses de remuneração ao acionista.

Segundo Nivalde de Castro, o exercício serve para mostrar os riscos financeiros inerentes à operação das térmicas e que não têm sido calculados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

“As térmicas estão sendo muito acionadas. E enfrentam alguns problemas por esse motivo. Quando são acionadas e não operam precisam pagar ressarcimento, que é indexado ao PLD [preço de liquidação de diferenças, ou preço spot]. Esse ressarcimento acaba comendo a receita fixa”, disse Castro, ao Valor.

“Nos próximos leilões, este risco financeiro será precificado. Então o investidor pode não se interessar [em participar do leilão] porque o preço-teto que a EPE estipula não reconhece esse risco financeiro”, completou o especialista.

Os autores do estudo acreditam que o despacho contínuo das termelétricas deverá se manter, no mínimo, até novembro. Os próprios integrantes da equipe energética do governo sinalizam que todas as térmicas deverão permanecer acionadas, apesar da melhora do quadro de abastecimento em relação ao início do ano.

“A situação que se materializou no primeiro quadrimestre de 2014, com o surgimento de obrigações financeiras extraordinárias de volume incompatível com a capacidade de pagamento dos projetos termelétricos pode e agravar, comprometendo a própria viabilidade econômica de várias usinas”, concluem os especialistas, que recomendam o aperfeiçoamento das regras de comercialização de energia.

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