Exemplo de sucesso nos leilões públicos na última década, o modelo de licitação de linhas de transmissão parece ter se esgotado e desponta como potencial indutor de um novo gargalo no setor elétrico. As receitas, que antes eram consideradas adequadas para construir, operar e manter em ordem as linhas, além de remunerar o investidor, hoje são vistas como entrave à atração de novos empreendedores. Junta-se a isso o cenário econômico, com juros em alta, e medidas setoriais que ajudaram a reduzir o caixa das tradicionais empresas de transmissão.
O resultado tem sido uma crise de investimentos em novas linhas e subestações. Nos últimos três anos, 42% dos lotes colocados em licitação e considerados essenciais para a segurança do sistema não receberam proposta, segundo dados do Instituto Acende Brasil (complementados com dados levantados pelo Estado). No ano passado, o resultado foi pior: 60% dos trechos ofertados não foram arrematados.
A situação é ainda mais complicada se for somado a esse quadro o atraso dos empreendimentos arrematados. Ou seja, o governo não tem conseguido leiloar todos os lotes e os projetos que consegue licitar demoram para ficar prontos – o que “aumenta a possibilidade de surgimento de gargalos para o transporte de energia”, afirma a consultoria PSR, em recente relatório. Isso significa ficar mais sujeito a desligamentos.
“A falta de investimentos, indicada por leilões que não tiveram empresas interessadas, pode criar sério desequilíbrio entre geração e distribuição, prejudicando o planejamento do setor de forma muito preocupante”, diz o professor do Grupo de Estudos do Setor de Energia Elétrica da UFRJ, Nivalde Castro.
O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, explica que nos últimos anos houve um aumento do número de lotes leiloados por causa do volume maior de intercâmbio de energia entre regiões e pelo avanço de usinas intermitentes no sistema, a exemplo das eólicas. A expansão da necessidade de novas linhas de transmissão, no entanto, coincidiu com a crise econômica e com as condições mais restritas e caras do crédito.
Além disso, a renovação das concessões, em 2013, diminuiu a capacidade de investimento das empresas. Dados do Instituto Acende Brasil mostram que a receita das tradicionais empresas do setor caiu, em média, 24%. Ao mesmo tempo, as obras de reforços e melhorias da rede existente aumentaram, pois está cada dia mais velha e maior. “Essas empresas desapareceram dos leilões”, afirma o presidente do Acende Brasil, Claudio Sales.
Isso inclui as estatais do grupo Eletrobrás (Eletronorte, Chesf, Furnas e Eletrosul), que sempre tiveram participação relevante nas licitações. Segundo Sales, essas companhias têm algo em torno de R$ 20 bilhões a receber de indenização do governo federal por causa da renovação das concessões. Mas ainda não se sabe como esses valores, em discussão, serão pagos. Uma solução em estudo é o pagamento só a partir de 2019.
Entre investidores estrangeiros, o apetite também não anda muito aguçado. As espanholas, que nos últimos anos foram grandes protagonistas dos leilões ao lado das estatais, estão com a saúde financeira debilitada. A Abengoa entrou em recuperação judicial e a Isolux está em recuperação extrajudicial.
Tolmasquim confirma que os leilões frustrados de linhas de transmissão são um ponto de preocupação dentro do governo, que já criou grupos de estudos para tentar encontrar alternativas para o problema. A taxa de retorno já foi elevada e o prazo para construção das linhas, ampliado. “Está todo mundo ciente e trabalhando para atrair investimentos estrangeiros”, diz Tolmasquim, que no fim de 2015 fez um road show no exterior tentando convencer novas empresas a investir no setor.
Geração. A falta de interesse dos empreendedores pode respingar em outras áreas do setor de energia, como os investimentos em geração. Desde 2013, após casos de parques eólicos parados por falta de linha, o governo decidiu que só poderiam participar dos leilões projetos que comprovassem ter conexão pronta para escoar a energia.
De lá para cá, a carteira de projetos com esse perfil foi se esgotando. Se o governo não conseguir dar mais atratividade para os leilões, o setor pode ter problemas para participar de novas disputas. A presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum, afirma que o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, pediu para a entidade estudar um modelo para que as empresas produtoras de energia eólica pudessem investir nas linhas de transmissão.
“Criamos um grupo e estamos desenhando um modelo para apresentar ao governo”, diz. Uma das sugestões é ter lotes menores. Outra proposta em estudo pelo ministério é leiloar as usinas com a linha de transmissão. Procurado, o ministério não comentou o assunto.
Para lembrar. Em dez anos, a rede de transmissão de energia elétrica cresceu 50%, ou mais de 41 mil quilômetros de extensão. Até 2014, o sistema nacional tinha 125.149 km – praticamente o dobro de 20 anos atrás. O avanço dos investimentos ocorreu especialmente depois de 2001, quando o Brasil enfrentou o maior racionamento da história.
Na época, a rede de transmissão – e suas limitações para levar energia de uma região para outra – foi eleita a grande vilã da falta de energia. Os reservatórios da Região Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste estavam vazios por causa da seca que atingiu o País naquele ano. Enquanto isso, as represas da Região Sul jogavam água fora e poderiam ter fornecido energia para os demais Estados se as linhas de transmissão tivessem mais capacidade.
Depois disso, o governo leiloou 209 lotes de linhas de transmissão. Mas, apesar da forte expansão, ainda não é suficiente. Como as novas usinas hidrelétricas estão sendo construídas em locais distantes dos grandes centros de consumo, as linhas são muito extensas e têm custos bilionários. Além disso, para garantir a segurança do sistema, é preciso fazer investimento na redundância da rede – ou seja, se houver alguma ocorrência numa determinada linha, haverá uma outra para suportar a demanda.
Fonte: Estadão
Comentário do presidente da ABRAPCH, Ivo Pugnaloni:
Vejam como é muito fácil provocar gastos bilionários para a indústria do petróleo na geração de termoelétrica. Basta como em mais esse caso reduzir-se a valor inexequíveis os tetos dos leilões de transmissão e de geração por fontes renováveis e pronto!
Num passe de mágica, muito simples. você consegue fazer com que não exista energia de fonte hidráulica suficiente numa região e pronto!
Justificado estará construir mais uma termoelétrica movida a derivados de petróleo importado! A alternativa? Convocar a Primeira Conferência Nacional de Energia para que a sociedade brasileira abra a caixa-preta que nos tem levado ao nada invejável posto de país com a energia mais cara do mundo para a indústria. Outra maneira infalível de aumentar os lucros das térmicas a petróleo é contratar pessoas para fazer “protestos” contra a construção de novas hidrelétricas mesmo as de baixo impacto ambiental.
“Demonizar” as Pequenas Centrais Hidrelétricas, por exemplo, é uma atividade “muito lucrativa” para os que se dedicam a trabalhar contra as indústrias de seu país, contra o desenvolvimento sustentável e a favor da poluição por gases das térmicas, disse Ivo Pugnaloni.
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