Embora tenha aprovado há poucos dias um orçamento para o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), válido para o atual exercício, no montante de R$ 612 milhões, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não desistiu de tentar enquadrar o Operador em custos mais compatíveis com a realidade atual da economia, em geral, e do setor elétrico, em particular.
Nesta quinta-feira, 03 de março, encerra-se o prazo para que os agentes encaminhem à agência reguladora contribuições ao processo de audiência pública que se arrasta desde 2013, quando a Aneel decidiu atualizar o Estatuto Social do Operador. Alertada pela própria área jurídica para o fato que a agência não tinha essa competência, a audiência pública foi então transformada em um atalho para que o ONS possa melhorar a sua gestão orçamentária, da qual muita gente reclama. “O ONS custa muito caro”, argumentou um agente da área de geração, que não quis se identificar para esta matéria.
Em contraponto a uma nota técnica de 20 páginas e 89 itens, a Aneel preparou uma minuta de resolução que tem apenas três páginas e apenas cinco artigos. Mais relevante do que aquilo que está escrito na minuta de resolução, entretanto, é o que pode ser subentendido nas suas entrelinhas, pois, há muito tempo, existe uma indisfarçável falta de sintonia recíproca entre os dois organismos oficiais.
Acostumado a dar as cartas inclusive no próprio Ministério de Minas e Energia, que dispõe de uma área técnica na qual faltam especialistas e sobram tarefas, e que por isso se socorre constantemente junto ao ONS, este se julga com suficiente autonomia para tocar a vida sem dar muito papo para a Aneel, embora obviamente respeite todas as determinações legais.
Dentro da Aneel, há quem se espante com o fato de o ONS, com um orçamento superior a R$ 600 milhões, não contar até hoje com uma auditoria interna ou uma externa independente para acompanhar os seus gastos. Na agência, a discussão não está em eventuais desvios de dinheiro, pois se reconhece a seriedade do pessoal do ONS. As dúvidas residem na qualidade do gasto dos recursos disponibilizados para o Operador.
Tanto que a nota técnica 152, de 2015, na qual se lastreia a audiência pública, lembrou que o ONS precisa aprimorar alguns procedimentos, entre os quais seguir as orientações e padronizações estabelecidas no Manual de Acompanhamento e Fiscalização emitido pela própria Aneel na apresentação do orçamento e da prestação de contas anual. A NT também diz que o Estatuto do ONS deveria conter um dispositivo que o obrigasse a “zelar continuamente pela eficiência e eficácia na condução de seus processos administrativos, mediante ações de gestão e controle que promovam o bom uso de seus recursos orçamentários”. As áreas técnicas da Aneel avaliam que o regulador está exigindo do ONS, enfim, que ele apenas seja eficiente na administração orçamentária, “uma vez que ela é arcada, em última instância, pelo consumidor de energia elétrica”.
Na minuta de resolução que integra o processo da AP, a agência diz que “o ONS deve zelar continuamente pela eficiência e eficácia na condução de seus processos administrativos, mediante ações de gestão e de controle que promovam o uso prudente de seus recursos orçamentários nas despesas de custeio e investimentos”. Entre as ações que o Operador poderá utilizar para se enquadrar na resolução, a Aneel recomenda a priorização da gestão centralizada nas aquisições de materiais e contratação de serviços para a sede e os centros regionais de operação. Também sugere que a compra de materiais e a contratação de serviços sejam efetuados “mediante processos competitivos, tais como leilões e tomada de preços”.
A minuta de resolução também diz que o Operador deverá melhorar os critérios da sua governança, mediante novas estruturas de administração e controle, “que promovam a redução dos riscos e a otimização dos resultados”. Um funcionário de alto coturno da Aneel lembrou a este site que causa perplexidade dentro da agência o fato de o Operador não dispor de auditoria interna e tampouco de uma auditoria externa independente e que, até hoje, as contas passam apenas pelo crivo de um burocrático Conselho Fiscal.
A mesma fonte explicou que a criação, pelo ONS, de uma auditoria interna, que possa trabalhar com autonomia, é um instrumento moderno de governança. E comparou o ONS com a CCEE, que também dispõe de uma auditoria externa independente.
Aliás, o que não falta na NT da Aneel — e a agência não esconde isso — é comparação entre a governança do ONS e da CCEE. Para os especialistas da agência, haveria um enorme ganho para os associados do Operador na medida em que este possa aprimorar a sua governança, aproximando-a dos padrões já adotados pela CCEE.
Além de colocar a CCEE como parâmetro a ser observado pelo ONS, a Aneel enxerga uma outra coisa na sua tentativa de melhorar a gestão orçamentária do Operador. Na visão da agência reguladora, é fundamental que os associados do ONS se interessem mais pelas atividades rotineiras do Operador, acompanhando o seu dia a dia mais de perto e mostrando o cartão amarelo quando for necessário.
“Muita gente fica reclamando que o ONS custa caro e que é preciso colocar um freio nos seus gastos. Só que não me consta que os associados, que são os donos do ONS, tenham tomado algum tipo de iniciativa para coibir esses fatos. O orçamento de 2014/2015 foi ligeiramente superior a R$ 527 milhões. Agora, já passou de R$ 600 milhões. As pessoas se acostumaram a jogar tudo para cima da Aneel, quando poderiam atuar mais fortemente dentro do ONS, para evitar a explosão dos seus custos”, lamentou uma fonte qualificada da agência.
O pano de fundo para as mudanças que a Aneel pretende implementar em relação à gestão orçamentária do ONS está diretamente relacionado com uma alteração relevante que ocorrerá a partir de 2018, quando os recursos orçamentários do Operador serão arrecadados exclusivamente por meio de contribuições associativas. “No meio do caminho, deverá ter uma fase de transição, é verdade, mas a nova realidade orçamentária do Operador ainda é uma incógnita”, disse a mesma fonte.
Fonte: Paranoá Energia
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