O governo federal está fazendo os últimos ajustes no texto que deve definir a nova lei do licenciamento ambiental antes de enviar a proposta ao Congresso. O projeto de lei visa atender aos pleitos do setor produtivo de desburocratizar e dar mais agilidade ao processo de concessão das licenças, sem, contudo, eliminar exigências atualmente previstas. O texto-base é o substitutivo aprovado na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara, com relatoria do deputado federal Ricardo Trípoli (PSDB-SP), e vem sendo discutido desde junho em reuniões que envolveram todos os Ministérios, com coordenação da Casa Civil.
A expectativa do governo é de que a proposta seja encaminhada ao Congresso até o final do ano. Entre as mudanças previstas, o texto define em 12 meses o prazo máximo para análise dos pedidos de licença prévia (LP) aos projetos de infraestrutura e seis meses para a licença de instalação (LI). Outra novidade é a classificação dos empreendimentos conforme o potencial de causar dano ambiental, levando em conta porte, grau de relevância ambiental da área em que está localizado e o impacto da atividade. Pela nova regra, empreendimentos localizados em regiões de menor relevância ambiental podem ter o licenciamento simplificado, com a possibilidade de dispensa da apresentação de estudos de impacto ambiental (EIA-Rima).
No entanto, a lei não deve detalhar processos de licenciamento específicos, como de uma hidrelétrica ou indústria. Segundo o Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que está conduzindo o processo, será uma lei ampla, com normas gerais, que serão aplicadas ao licenciamento realizado pelo Ibama, quanto pelos Estados e municípios.
A proposta foi capitaneada pelo ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, com o objetivo de fazer frente a outros projetos que tramitam no Congresso que visam flexibilizar as exigências do licenciamento ambiental. Um deles, que chegou a ser colocado na pauta para votação este mês, é o projeto de lei (PL) 3.729/2004, de relatoria do deputado Mauro Pereira (PMDB-RS), que dispensa o licenciamento para várias atividades do agronegócio e prevê ainda um licenciamento autodeclaratório, por cadastro eletrônico, sem a exigência de checagem por parte dos órgãos ambientais. O projeto de Pereira tem o apoio da bancada ruralista e de entidades como a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI), mas é rechaçado por ambientalistas, que o consideram um desmonte da legislação atual.
“Essa proposta flexibiliza excessivamente o licenciamento ambiental, o que pode levar a insegurança jurídica e aumentar o risco de tragédias como a de Mariana”, afirma Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental (ISA). A proposta de nova lei do licenciamento que está sendo conduzida pelo governo ainda não foi apresentada às ONGs, mas Guetta acredita que aspectos técnicos do processo de licenciamento serão preservados, já que a proposta foi encampada pela presidente do Ibama, Suely Araújo, e recebeu contribuições de vários ministérios. “O texto que vem sendo discutido na Casa Civil não elimina o licenciamento em três fases para os grandes empreendimentos de infraestrutura, mas poderá simplificar o processo para obras de menor impacto. O que não podemos aceitar é o auto-licenciamento”, diz Guetta.
Para Mário Mantovani, diretor de políticas públicas da SOS Mata Atlântica, a proposta do governo deve se posicionar no meio do caminho entre os pleitos do setor produtivo e as expectativas dos ambientalistas. “Esse texto deve evitar um mal maior, que é a aprovação pela Câmara de uma proposta que não visa trazer nenhuma contribuição para modernizar o licenciamento, e sim facilitar as coisas para o agronegócio”, diz Mantovani.
Para o setor de infraestrutura, a principal demanda é de mais agilidade na emissão das licenças ambientais, pois o atraso em muitos casos chega a comprometer obras e elevar os custos dos empreendimentos. “Há projetos que dependem do regime de chuvas, como na região amazônica. Se há um atraso na aprovação das licenças, as obras só podem ser iniciadas no ano seguinte, o que compromete todo o cronograma”, afirma Venilton Tadini, vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). A entidade tem afinidade com o projeto de nova lei de licenciamento do governo federal e aguarda a definição do texto da proposta. “As discussões sobre o projeto foram bem técnicas, tanto no Ministério do Planejamento quanto na Casa Civil. A expectativa é que o projeto aponte para a racionalização do rito de licenciamento e fortalecimento dos órgãos ambientais”, diz Tadini.
A Abdib defende algumas medidas para facilitar o processo de obtenção das licenças: entre elas, a criação de um banco de dados nacional sobre a biodiversidade e patrimônio cultural, que sistematize e permita a consulta de informações sobre fauna, flora e patrimônio de áreas já estudadas em outros processos de licenciamento. Outra sugestão da associação é a simplificação do rito do licenciamento, com a instituição de uma licença única – um só documento traria um atestado da viabilidade ambiental do empreendimento e a autorização para o início da obra por parte do empreendedor.
Fonte: Valor Econômico
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