Enquanto parte do mundo investe em uma nova indústria que produza mais, poupe energia e, assim, suje menos o ambiente com gases de efeito estufa, o Brasil segue parado nessa transição.
É o que concluiu um estudo sobre o setor feito pelo Instituto Escolhas, organização que pesquisa áreas como energia e sustentabilidade.
Tudo rema contra. O parque fabril nacional é antigo, com estruturas ainda da década de 1970. A carga tributária torna a produção nacional menos competitiva no exterior e a crise freia os investimentos em inovação.
"O grosso da indústria nacional é de baixa e média tecnologias. É também bastante poluente e ineficiente, com uma aposta em commodities sem valor agregado", afirma Ricardo Sennes, diretor da consultoria Prospectiva.
Essa inércia, diz o físico Shigueo Watanabe, um dos autores da pesquisa, é acentuada pelo fato de o país não ter clareza de como será sua base industrial. "Sobram ações para apagar incêndios pontuais, mas falta planejamento de longo prazo."
A atual indústria de base do país, que fabrica insumos para setores fundamentais da economia, como a construção civil, é dependente de muita energia para operar.
Seis setores (siderurgia, papel e celulose, cimento, cadeia do alumínio, químico e petróleo e gás) analisados pelo Instituto Escolhas respondem por 40% do consumo total de energia gasto pela indústria, diz a EPE (Empresa de Pesquisa Energética).
Todos eles também têm sido responsáveis por cerca de 15% das emissões de gás carbônico do país -o índice vem se mantendo estável nesta década, segundo o Seeg (sistema que mede as emissões de gases do efeito estufa).
Com uma vantagem, diz Tasso Azevedo, coordenador do Seeg. "O aço produzido no Brasil emite menos gás carbônico por tonelada que na China. Isso porque a nossa eletricidade é mais limpa. Temos que aproveitar isso."
ESTACIONADO
Mas é preciso investir.
O Banco Mundial estima ser necessário adicionar mais US$ 5,7 trilhões na economia até 2030 para tornar os processos produtivos mais sustentáveis em todo o mundo.
Para Marisa Grossi, presidente do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), a transição só ocorrerá se for diversificada. "O Brasil sempre apostou em nichos e não pensou no todo. Ficamos estacionados no etanol, mas temos que fazer do carro elétrico uma alternativa viável."
Segundo Tasso Azevedo, do Seeg, a saída para financiar a indústria "verde" é taxar a emissão de carbono. "Sujou, pagou. Quem polui menos seria mais competitivo e teria mais dinheiro para investir nessa transição."
E incorporar no chão de fábrica processos da internet das coisas, com toda a produção interconectada em uma base gigantesca de dados, diz o economista Rafael Cagnin, do Iedi (entidade que estuda a indústria). "A Europa tem feito isso para diminuir seu custo fabril e reduzir a dependência do gás russo."
Já no Brasil, a estratégia do governo foi investir R$ 500 bilhões do BNDES em uma indústria sem conexão com a sustentabilidade, diz Watanabe, do Instituto Escolhas. "Foi como olhar para o retrovisor." Procurado, o BNDES não se manifestou até o fechamento da reportagem.
Fonte: Folha de São Paulo
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