Governo estuda separar contratação de energia e capacidade

A estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelo planejamento da área de energia do Brasil, tem estudado medidas de melhoria para o setor elétrico que incluem uma possível separação entre a contratação de nova capacidade em usinas de geração e a comercialização de eletricidade, disse à Reuters o presidente da instituição.

 

Por esse modelo, que já é adotado em outros países, o investidor que quiser construir uma nova usina poderá receber uma receita fixa pela capacidade disponibilizada ao sistema, chamada tecnicamente de “lastro”, e ainda ter liberdade para negociar no mercado a eletricidade que será produzida.

 

Pela atual regulamentação do setor elétrico do Brasil, lastro e energia são negociados como um produto único em leilões promovidos pelo governo, que contratam novas usinas e ao mesmo tempo já promovem a comercialização da produção futura junto às distribuidoras de eletricidade.

 

O presidente da EPE, Luiz Barroso, disse à Reuters que essa mudança, se implementada, poderia viabilizar o crescimento do mercado livre de eletricidade, onde grandes consumidores, como indústrias, podem negociar o suprimento em contratos diretos com comercializadoras de energia ou geradores.

 

“A EPE estuda permanentemente medidas para aperfeiçoar o modelo para a expansão da oferta, e a separação lastro e energia é algo que, dentre muitos outros assuntos, discutimos internamente como um importante mecanismo para apoiar principalmente a expansão para o mercado livre”, explicou Barroso, em nota.

 

Apesar de ter crescido fortemente no ano passado, o mercado livre de eletricidade ainda não viabiliza sozinho a expansão da geração, uma vez que as empresas no segmento geralmente fecham contratos de venda de energia com duração de até cinco anos, o que não é suficiente para que o investidor consiga financiamento para erguer uma usina.

 

Se o modelo mudasse, o gerador poderia utilizar a garantia da receita fixa que receberia pelo lastro para obter financiamentos. E a energia poderia ser comercializada no mercado livre, para distribuidoras ou em contratos puramente financeiros.

 

A ideia, no entanto, ainda está em fase de discussões, segundo Barroso.

 

“Não há ações para a implementação desta medida sendo avaliadas no momento… antes da implementação de qualquer medida de grande impacto na comercialização de energia, é necessário o entendimento do conceito, um detalhamento técnico, discussões entre todas as instituições, simulações e uma ampla discussão com o mercado”, afirmou.

 

A possibilidade de separação entre lastro e energia está entre os pontos que o Ministério de Minas e Energia estuda como formas de viabilizar uma expansão do mercado livre de eletricidade.

 

Em uma consulta pública sobre a expansão do mercado livre aberta em outubro passado, o ministério questionou os agentes de mercado sobre opiniões em relação a essa mudança.

 

Em suas contribuições, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) disse que a opção de separar lastro e energia exigiria a cobrança de um encargo junto a todos os consumidores “para custear o lastro”, ou seja, pagar a receita fixa aos geradores.

 

Mudança complexa

 

O professor de Engenharia de Energia da Universidade de São Paulo (USP) Dorel Ramos disse à Reuters que a ideia em estudo no governo seria positiva e poderia aumentar a eficiência no mercado elétrico, mas admitiu que o tema é complexo e pode não haver tempo hábil para implementar a mudança ainda no governo do presidente Michel Temer, que vai até o final de 2018.

 

“Se houver vontade política (é viável), mas o problema é que o governo tem prioridades maiores, e isso envolve negociação, tem que mexer em lei… entendo como mudança positiva, mas evidentemente não se pode esconder sua complexidade”, disse.

 

O presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel), Reginaldo Medeiros, elogia a intenção do governo de estudar o tema.

 

“Tem sido a linha geral desse governo promover mudanças estruturais em setores estratégicos do país e, definitivamente, o mercado elétrico é extremamente estratégico… uma organização eficaz do mercado leva a preços de energia menores no curto prazo”, defendeu.

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