O quadro atual da rede de transmissão de energia demonstra que o risco de ocorrência de novos apagões permanece por tempo indeterminado, segundo um documento do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Quase metade dos empreendimentos apontados como prioritários pelo ONS para reforçar a confiabilidade no sistema de transmissão enfrenta problemas para entrar em funcionamento.
O "Plano de Operação Elétrica 2018-2019" aponta que 73 dos 157 projetos listados ainda não obtiveram licença ambiental, estão em processo de revisão da outorga ou sequer foram concedidos. "Neste contexto, ressalta-se que a operaçãatilde;o eletroenergética do sistema interligado nacional estará submetida a uma série de restrições por um período ainda indefinido", afirma o relatório.
As obras de ampliação e reforço em subestações e linhas de transmissão foram selecionadas pelo ONS para eliminar quatro necessidades: corte de carga em condições normais de operação, restrições de escoamento de geração, acionamento ineficiente de usinas térmicas e corte de carga em situação de contingência nas capitais.
Dos 31 empreendimentos indicados como prioridade para evitar apagões em capitais, na hipótese de algum estresse no sistema, 16 estavam sem outorga ou licença ambiental – 4 no Paraná, 4 em Tocantins e 3 na Bahia. O documento do ONS foi divulgado em julho de 2017 e pode ter havido mudanças no status de cada um dos projetos desde então. Um leilão de novas linhas de transmissão, por exemplo, foi realizado em dezembro.
"O sistema está operando no limite. Quando isso ocorre, ele fica vulnerável a acidentes", diz o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires. "Um apagão não é culpa do governo. O que não tem cabimento é tanta demora para a recomposição do sistema", acrescentou o especialista, em referência ao episódio de quarta-feira, quando o suprimento de energia só foi totalmente restabelecido depois de cinco horas.
Um problema colocado em evidência pelo blecaute é a dependência dos "superlinhões" em um país de extensão continental, com grande volume de intercâmbio energético entre as regiões. Pires avalia que o melhor antídoto contra essa vulnerabilidade é um reforço na geração de energia térmica, principalmente no Nordeste. Em caso de queda no fornecimento, usinas movidas a gás natural ou óleo combustível têm capacidade de resposta mais rápida e permitem a recomposição célere do sistema.
"O problema é que as térmicas foram demonizadas no Brasil", afirma, elogiando o papel desempenhado pela geração eólica e solar. "Na Califórnia, para cada três megawatts de energias renováveis que entram no sistema, é preciso ter um megawatt em térmicas. Quanto mais a gente diversificar, melhor", completa.
O mesmo documento do ONS chama atenção para o impacto que podem ter quedas no sistema de escoamento das megausinas amazônicas. É o caso dos linhões que transferem a energia produzida pelo complexo hidrelétrico do rio Madeira (RO) ou por Belo Monte (PA). A falha em um disjuntor, anteontem, derrubou o bipolo em corrente contínua em 800 kV entre Xingu (PA) e Estreito (MG). Ele transferia em torno de 4 mil MW de Belo Monte para o subsistema Sudeste/Centro-Oeste e o resultado da ocorrência foi a desconexão do Norte/Nordeste.
No plano 2018-2019, um alerta nesse sentido aparece para o caso de perda súbita da energia produzida pelas megausinas, bem como um problema no escoamento de Itaipu. Dependendo da "situação operativa" no momento, afirma o relatório na página 20, os subsistemas Sul e Sudeste/Centro-Oeste podem acumular déficit de até mais 4 mil MW.
Segue, então, o documento do ONS: "O que implicará risco muito grande de ocasionar uma atuação do ERAC [esquema de alívio de carga com corte automático de fornecimento para não sobrecarregar toda a rede] nas regiões Sul/Sudeste e Centro-Oeste e até mesmo a perda de sincronismo da UHE Itaipu 60 Hz, com consequências severas para o sistema interligado nacional".
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Fonte: Valor Econômico.
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