Fim de subsídios deixaria conta de luz até 16% mais barata, aponta estudo


Corte em encargos e mudanças em contratos de Itaipu e Angra poderiam reduzir mais as tarifas, mas entraves políticos dificultam avanço.

Os consumidores brasileiros de energia poderiam pagar quase 16% a menos na conta de luz em 2025 caso os subsídios tarifários e outros custos embutidos nas tarifas fossem eliminados. A conclusão faz parte de um estudo da TR Soluções, feito a pedido do Valor, com base no orçamento provisório da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para este ano, que prevê um gasto total de R$ 39,6 bilhões – valor

integralmente bancado pelos consumidores.

A projeção-base da TR Soluções aponta para uma tarifa média no Brasil de R$ 782,90 por megawatt-hora (MWh) para consumidores residenciais em 2025. No cenário mais radical, em que todos os subsídios da CDE são eliminados, a tarifa cairia para R$ 682,86/MWh, uma redução média nacional de 12,8%.

Porém, o alívio tarifário não seria homogêneo entre as regiões. Consumidores do Sul teriam a maior redução, de 15,8%, seguidos pelo Sudeste (14,7%), Centro-Oeste (13,6%), Nordeste (8,3%) e Norte, com a menor queda (7,8%). A disparidade se deve à forma como a CDE é rateada atualmente – com Norte e Nordeste contribuindo

menos -, um modelo que será extinto em 2030, quando todas as regiões passarão a pagar o encargo de forma igual por MWh.

A CDE é um encargo que financia políticas públicas, como a tarifa social para a baixa renda, a compra de combustíveis para geração em regiões isoladas do país e a universalização do fornecimento de energia elétrica.

Contudo, a queda nas tarifas pode ser ainda maior, de acordo com a TR, caso o governo opte por duas medidas que não fazem parte da CDE, mas que permitiriam uma redução adicional nas contas dos consumidores. Uma delas seria a redução da tarifa de repasse da energia de Itaipu para consumidores do Sul, Sudeste e Centro- Oeste, como manda o Tratado de Itaipu, que poderia ter ocorrido em 2023.

A segunda é o rateio da energia das usinas nucleares Angra 1 e Angra 2 para todos os consumidores do país. Caso as duas medidas fossem adotadas, a redução média na conta de luz seria de 16,1%, indo para 21,1% no Sul do país.

Embora o estudo da TR Soluções também tenha analisado os impactos tarifários para consumidores de alta tensão (como grandes indústrias), a reportagem optou por focar apenas nos consumidores residenciais (grupo B1).

O pesquisador Hélder Sousa, responsável pelo estudo e CEO da TR, explica: “A proposta de reforma do setor elétrico mantém, até 2030, o rateio atual da CDE entre níveis de tensão. Somente após a conclusão da equalização entre as regiões é que se iniciaria a transição para a uniformização desse rateio, com conclusão prevista para 2038. Para os consumidores residenciais, isso tende a aliviar gradualmente a parcela da CDE nas tarifas. Já consumidores de alta tensão, como os da indústria eletrointensiva, devem experimentar aumento relativo na contribuição para o encargo.”

Embora o cenário mais agressivo, sem subsídios, torne as contas de luz mais baratas, ele não considera o papel social de parte dos encargos. Há especialistas que defendem o repasse destes, como parte de políticas públicas, para o Tesouro Nacional.

É o caso da Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE) – que atende 17,4 milhões de famílias de baixa renda – e da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) – que subsidia térmicas em regiões isoladas, principalmente na Amazônia Legal, que atendem, hoje, a cerca de 3 milhões de pessoas.

Juntos, os dois subsídios somam R$ 17 bilhões no orçamento da CDE em 2025. Em um cenário em que só esses dois benefícios essenciais são mantidos, a tarifa média seria de R$ 725,89 /MWh – redução de 7,3% na média nacional.

Esses dois benefícios são prioritários pela política energética do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem reforçado ações voltadas à população de baixa renda e à integração energética de regiões com pouca infraestrutura. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD/MG), disse recentemente que a base de uma reforma no marco legal do setor elétrico já foi apresentada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve assinar em breve uma medida provisória (MP) ao retornar da viagem à Rússia e à China.

A cerimônia deve ocorrer nesta quinta-feira (15) para lançar oficialmente a MP . Um dos pilares é a mudança nas regras da tarifa social, para atender a cerca de 60 milhões de pessoas.

Edvaldo Santana, ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e colunista do Valor, estima que a redução nas tarifas de energia poderia chegar a 22% caso fossem excluídas da base de cálculo os custos com o furto de energia, que são rateados com os demais consumidores. Para Santana, a eliminação de todos os

subsídios num prazo mínimo de cinco anos significaria que o setor elétrico voltaria aos eixos da racionalidade econômica. “Mas não vejo força política no governo para tamanha empreitada.”

Santana afirmou também que a proposta de novo modelo apresentada recentemente pelo ministro tem uma boa diretriz para a redução dos subsídios nas contas de luz, mas tem dúvidas se a medida passaria no Congresso Nacional. “O lobby já começou a se movimentar”, acrescentou.

A CDE também financia programas como o “Programa Mais Luz para Todos” , o incentivo às fontes renováveis (eólica, solar, biomassa) e o carvão mineral nacional. No cenário em que a tarifa social, a CCC e os incentivos às renováveis são mantidos, o orçamento da CDE cairia para R$ 32 bilhões, e a tarifa média seria de R$

762,81/MWh – ainda 2,6% inferior ao cenário-base.

Especialistas defendem cortes seletivos: por exemplo, os subsídios ao carvão mineral custam mais de R$ 1,2 bilhão por ano. Já os descontos tarifários para irrigação, saneamento e fontes incentivadas respondem, juntos, por R$ 16,7 bilhões, sem vínculo direto com políticas sociais dentro do setor elétrico. Deste valor, quase R$ 15

bilhões referem-se às fontes incentivadas.

No caso dos custos da energia comprada da hidrelétrica de Itaipu Binacional e das usinas nucleares de Angra, as tarifas também cairiam caso o governo decidisse por duas medidas esperadas pelo setor elétrico e que ainda estão em aberto. Para Itaipu, a questão envolve a redução da tarifa de repasse da usina, que remunera a energia não utilizada pelo Paraguai e exportada para o Brasil. Hoje, a tarifa de repasse é de US$ 17,66 por quilowatt (kW), mas esse valor deveria ser menor desde 2023, quando o financiamento da usina foi concluído, da ordem de US$ 13/kW.

Embora a estatal esteja fora do escopo da CDE, especialistas afirmam que ela impacta negativamente a conta de luz de 130 milhões de consumidores do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, já que, mesmo após a quitação da dívida histórica de construção, quase R$ 7 bilhões por ano que poderiam ser usados para reduzir as tarifas estão sendo destinados a políticas públicas que beneficiam o Paraguai inteiro e no lado brasileiro, apenas o Paraná e alguns municípios de Mato Grosso do Sul. 

Ao Valor o presidente da Frente Nacional dos Consumidores, Luiz Eduardo Barata, relembra que, em uma reunião realizada em abril de 2024 com o presidente Lula e especialistas para discutir formas de reduzir a conta de luz, ele alertou que a Itaipu possui uma das energias mais caras do Brasil, mas, até o momento, nenhuma medida foi tomada. 

Há também discussões em andamento sobre a reformulação dos contratos das usinas nucleares de Angra 1 e 2, e sobre a possível conclusão de Angra 3 – esta última, ainda sem custos estimados e sob avaliação do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

Hoje, as usinas nucleares são remuneradas por cotas-parte pagas pelos clientes das distribuidoras do Sistema Interligado Nacional (SIN). A proposta é que as usinas também passem a ser remuneradas pelos consumidores que estão no mercado livre, no qual eles podem escolher a geradora e as condições de fornecimento. Com mais consumidores pagando por essa energia, os custos per capita tendem a cair. Outro fator que pressiona as contas de luz são os subsídios concedidos à chamada Micro e Mini Geração Distribuída (MMGD) – sistema em que consumidores, como residências e comércios, instalam painéis solares ou outras fontes renováveis para gerar sua própria energia. Quem não possui esse tipo de instalação acaba arcando, indiretamente, com parte dos custos da rede elétrica, o que encarece suas tarifas.

A diretora técnica da consultoria PSR, Angela Gomes, explica que a Lei nº 14.300, aprovada em 2022, garantiu benefícios aos consumidores que já possuíam sistemas de geração distribuída na época, permitindo que continuem isentos de vários encargos até 2045. Esses subsídios não passam pela CDE e são incluídos de forma implícita nas tarifas pagas por todos os demais consumidores. Com isso, o número de instalações disparou, e a MMGD já representa cerca de 38 gigawatts de potência – mais de 15% do parque gerador do país.

Conforme subsidiômetro da Aneel, o subsídio à MMGD foi, de longe, o que mais avançou em 2024, atingindo R$ 12 bilhões no ano. Segundo a PSR, cada bilhão de reais na tarifa representa um custo adicional de 0,4% ao consumidor. Isso significa que sem a geração distribuída, o alivio sentido ao consumidor seria de 4,8%

“Considerando o acelerado crescimento recente da MMGD, espera-se que seus subsídios fechem o ano de 2025 como os mais vultosos do setor elétrico brasileiro”, acrescenta Angela.

Imagem e Conteúdo por Valor Econômico.

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/05/14/fim-de-subsidios-deixaria-conta-de-luz-ate-16-mais-barata-aponta-estudo.ghtml#

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